Para impedir a CLÁUSULA DE SOBREPOSIÇÃO [‘override clause’]de Netaniahu, os israelenses devem sair às ruas, AGORA
[ Por Raviv Drucker | Haaretz | 9|11|2022 | traduzido por José Manasseh Zaguri ]
Benjamin Netaniahu está sinalizando calma. Ele quer baixar as labaredas, disse em seu discurso da vitória na semana passada. Em conversações privadas ele descreve isso como seu “mandato do legado” no cargo, explicando que entende exatamente como a formação da nova coalizão governamental será percebida em Israel e no exterior e que sabe como se conduzir nessas circunstâncias.
Na sexta-feira , fez uma declaração, após “conversas A portas fechadas”, dizendo que o status quo da comunidade LGBT será mantido e que não haverá mudanças em relação à manutenção das paradas do orgulho gay.
É tentador acreditar no espírito de reconciliação que tomou conta dele, até que você lembra que se trata de uma pessoa que converteu a mentira em sua principal estratégia política. O instinto é respeitar as regras do jogo e o processo democrático de tomada de decisão, até que você recorda que nem Netaniahu nem seus seguidores respeitaram, nem por um instante, as decisões democráticas anteriores.
Ele se recusou a participar no ano passado da cerimônia de posse do novo primeiro-ministro; pela primeira vez desde o estabelecimento do estado, recusou-se a passar o poder a seu sucessor de forma apropriada; não concordou em chamar Yair Lapid de primeiro-ministro e torpedeou a legitimidade do governo que está de saída, desde que este tomou posse.
Devemos conceder 100 dias de graça ao novo governo? Um assunto principal deve determinar isso: o que Netaniahu vai decidir sobre a “cláusula de sobreposição“, que daria poderes à Knesset para derrubar uma determinação da Suprema Corte. De todos os lados da coalizão que está tomando forma, escuta-se que se trata de um fator decisivo, seu ponto de partida “mesmo antes da posse do gabinete”. Que só aceitarão a versão completa – não apenas sobrepor-se à Suprema Corte quando ela rejeitar uma lei aprovada pela Knesset, mas também possivelmente caso se sobreponha à Knesset em qualquer situação que não seja do agrado da coalizão governamental.
Essa chamada “cláusula de sobreposição” se constitui na derrubada do sistema israelense, na obliteração da Suprema Corte de Justiça, uma instituição que por décadas foi o único suporte das minorias e dos fracos.
Até mesmo os grupos de direita correram para ela contra a retirada de Gaza, quando quiseram deslegitimar o ex-ministro da Suprema Corte Menahem Mazuz por aceitar a petição da família de um terrorista palestino contra a demolição de sua casa, ou quando tentaram legitimar a candidatura do ex-membro do Yamina, Amichai Chikli para concorrer como candidato independente.
A cláusula de sobreposição vai transformar Israel desde a raiz. Em verdade, todas as mudanças que o governo anterior de Netaniahu quis fazer vão parecer um passeio no parque, comparadas com esse tipo de lei. Nesse sentido, a tentativa de aprová-la será um nocaute em termos de tudo o que significa um Israel democrático, mesmo antes de o novo governo começar a governar.
Os líderes da coalizão que ao que parece será formada, têm sonhado por anos em fechar a Suprema Corte de Justiça. Agora eles estão seguros de que graças à desesperança e à depressão dos opositores, conseguirão aprovar essa cláusula de forma relâmpago.
Se Netaniahu optar por isso, não teremos um único minuto de graça para perder. Resistência a essa legislação pelos membros da eclética oposição que foi criada pode unificar essas forças. Desde o Balad até o Tikvah Chadasha, eles entendem muito bem que tipo de país será este se cada intervenção da Suprema Corte em regulações que afetem o Ministério da Economia, por exemplo, ou a decisão de construir prisões particulares, possam ser revertidas em dois minutos pela maioria automática da coalizão governamental.
A portas fechadas, os líderes do governo que está de saída expressaram assombro em mais de uma ocasião com a oposição liderada pelo Likud. Não pelos insultos ou pela não participação nas comissões da Knesset, mas pela sua energia, as tentativas de atrito e as noites em claro na Knesset. Infelizmente, não se pode esperar esse tipo de luta por parte dos líderes da nova oposição. A coalizão majoritária é grande e difícil de apagar. Mais ainda, será extremamente difícil para a nova oposição liderar um esforço determinado. Benny Gantz e Gadi Eisenkot não foram criados para esse tipo de luta. Meirav Michaeli, Ayman Odeh e Ahmad Tibi não tem habilidades de liderança para liderar nada.
Mas isso não deve enfraquecer a intensidade da luta. O assunto da cláusula de sobreposição é suficientemente importante para ser levado às ruas, para usar todos os meios legais para deixar claro para o governo que não passará, que lutar por isso vai manchar seu mandato e transformar Israel num país percebido pelo mundo como apenas semi-democratico.
Sim, o campo liberal está esgotado após anos de luta. Os filantropos estão desesperançados, os ativistas Amir Heskel e Ilan Paz anunciaram que não aguentam mais, que outros assumam a batalha. Podemos entendê-los. Se o campo democrático não produzir novos líderes preparados para lutar, então realmente merecemos que aqui seja uma nova Hungria. No mundo inteiro as pessoas estão indo para as ruas pelas coisas que lhes são caras. Às vezes isso acontece em lugares muito mais duros do que Israel, com as pessoas correndo um grande risco de serem presas ou até mesmo mortas no processo – e ainda assim saem às ruas.
Por qual causa os amantes da Democracia sairiam às ruas em Israel se não para impedir esse governo de matar o último defensor da Democracia, a Suprema Corte de Justiça?
[ por Raviv Drucker | Haaretz | 9|11|2022 | traduzido por José Manasseh Zaguri ]