O autor argumenta que a paz permanece evasiva porque o conflito é sem precedentes na história humana.
[ por A.B.Yehoshua | Haaretz | 26|04|2011 | traduzido pelo PAZ AGORA|BR www.pazagora.org ]
A questão no título deve ser ostensivamente dirigida a um especialista do Oriente Médio, um cientista político, ou mesmo a um historiador estrangeiro; não a um escritor cuja experiência é sua imaginação. Mas como a pergunta é real, e dolorosa para todos na região, independentemente de sua nacionalidade, tentarei propor uma resposta.
Esta pergunta é séria e perturbadora por duas razões. Primeiro, o conflito israelo-palestino é um dos conflitos mais longos da era moderna. Se marcarmos seu início no início do assentamento sionista na Palestina na década de 1880, o conflito tem sido ativo, em sangue e fogo, por cerca de 130 anos.
Segundo, este não é um conflito remoto em um lugar esquecido por Deus, mas um que está constantemente no centro da consciência internacional. Isso significa que é um dos conflitos mais tratados no mundo. Só nos últimos 45 anos, o conflito entre os palestinos e os israelenses tem sido objeto de sérias tentativas de mediação por muitos países e organizações internacionais respeitáveis. Presidentes dos Estados Unidos tentaram mediar pessoalmente entre os lados. Chefes de governo de todo o mundo dedicam sua atenção a ele; emissários de alto nível vêm à região para tentar a mediação e o compromisso. Tudo isso além de iniciativas incansáveis de organizações e indivíduos de ambos os lados em simpósios e reuniões bem-intencionadas. Estudos, livros e inúmeros trabalhos de posição foram escritos e estão sendo escritos o tempo todo.
E embora os lados tenham chegado a acordos parciais em conversações diretas, secretas e abertas, e embora as fórmulas para uma solução tenham parecido claras e aceitáveis, e mesmo que estas sejam duas pequenas nações que estão ostensivamente sujeitas a ditames internacionais, o conflito ainda contém um núcleo interno que teimosamente se recusa a se render à paz.
É verdade que houve muitos erros e oportunidades perdidas de ambos os lados ao longo dos anos. E como esse conflito é cíclico e não linear – em outras palavras, o tempo não necessariamente nos aproxima de uma solução, mas a paz se aproxima e recua em junções históricas no passado e no futuro – há razão para se perguntar o que torna esse conflito único em comparação com outros conflitos, o que o faz perseverar tão zelosamente. Não presumo que minha resposta seja exclusiva, mas tentarei testá-la.
O conflito israelo-palestino se recusa a ser resolvido porque é um conflito sem precedentes na História humana. Não há precedentes para uma nação que perdeu sua soberania há 2.000 anos, foi espalhada entre as nações, e mais tarde decidiu por razões internas e externas retornar à sua antiga pátria e lá restabelecer a soberania . Portanto, se todos consideram o retorno moderno a Sion um evento único na História humana, isso significa que o povo palestino ou os árabes israelenses também foram forçados a enfrentar um fenômeno único que nenhuma outra nação enfrentou.
No início do século XIX havia apenas cerca de 5.000 judeus na Terra de Israel, em comparação com os 250.000 a 300.000 árabes palestinos. Na época da Declaração de Balfour, em 1917, havia cerca de 50.000 judeus em comparação com 550.000 palestinos árabes. (Esses números são da Enciclopédia Judaica). E em 1948 havia cerca de 600.000 judeus contra 1,3 milhões de árabes palestinos.
O povo judeu, assim, rapidamente se recolheu de todos os cantos do mundo. Eles não queriam expulsar os palestinos, e certamente não destruí-los, mas também não queriam integrá-los à sociedade judaica como outras nações fizeram com os moradores locais. Além disso, não houve nenhuma tentativa aqui de impor um regime colonial, uma vez que os judeus não tinham um país-mãe que os tivesse enviado em conquistas coloniais, como no caso da Grã-Bretanha ou da França. Aqui algo original e único na História humana ocorreu: uma nação chegou à terra natal de outra nação para substituir sua identidade por uma antiga.
É por isso que, em seu nível mais profundo, o conflito israelo-palestino não é uma questão de território, como no caso de muitos conflitos históricos entre as nações, mas uma batalha sobre a identidade nacional de toda a pátria – cada pedra e cada parte dela. Para ambos os lados, e principalmente para os palestinos, o tamanho da nação que os confronta não é claro – se consiste apenas de judeus israelenses ou de toda a diáspora judaica. E os israelenses não sabem se estão confrontando apenas o povo palestino ou toda a nação árabe. Em outras palavras, as fronteiras demográficas dos dois lados também não são claras. Trata-se, portanto, de um conflito fundamental que constantemente cria desconfiança primitiva e profunda entre os dois povos, impedindo uma possível solução.
Ainda é possível resolver o conflito sem acabar na armadilha de um Estado binacional? Acredito que sim, mas como esta é uma pergunta que não me fizeram, não responderei agora.
[ por A.B.Yehoshua | Haaretz | 26|04|2011 | traduzido pelo PAZ AGORA|BR www.pazagora.org ]