Após 12 anos com Benjamin Netanyahu no poder, Israel ainda está contagiado pela doença que ele deixou: fazer uma coisa, enquanto, sem uma piscada, dizer ao público exatamente o oposto.
Assim como Netanyahu conseguia manter conversas de coalizão com a Lista Árabe Unida enquanto abastecia o público com a mentira de que esses eram “apoiadores do terrorismo” que precisam ser descartados como parceiros, assim é o contato com a Autoridade Palestina, um fato por um lado e um tabu político no outro. No Israel de 2021, tornou-se perfeitamente razoável manter conversações completamente abertas com o Hamas, e até mobilizar fundos para a organização, embora sem revelar a ninguém que também estamos conversando com Mahmoud Abbas.
A reunião aberta do Ministro da Defesa Benny Gantz com o presidente palestino em Ramallah, mesmo sem fotografias, visou enfraquecer a desilusão que se enraizara entre israelenses – de que não existe, e não deve existir, qualquer conversação com a AP. A verdade é obviamente o oposto. As relações – por mais desbalanceadas que sejam – são mais fortes do que nunca, tanto entre governos quanto no terreno.
Afinal, é impossível viver nesta região sem cooperar em algum nível em segurança, economia, assuntos civis – em todas as vias da vida. Governos israelenses têm interesse tanto em dominar a AP quanto em evitar a sua queda.
Após anos nos quais Netanyahu insistiu em esconder esses laços tanto quanto possível, dando a maior parte do trabalho para ministros da defesa e finanças (alguém lembra de Moshe Kahlon?), o atual governo está fazendo o óbvio, tirando essas relações do armário. Só assim podemos lidar com o problema criado pelo governo anterior: o fortalecimento do Hamas às expensas da Autoridade Palestina.
Tanto quanto esta atitude é óbvia, refletindo uma realidade que qualquer pessoa sensível pode ver como inevitável, a resposta particularmente infantil do primeiro-ministro Naftali Bennett aos eventos recentes desaponta.
“O encontro Gantz-Abbas foi aprovado previamente pelo primeiro-ministro”, disse ele. “Foi uma reunão sobre assuntos atuais de defesa concernentes à Autoridade Palestina. Nenhum processo diplomático está sendo conduzido com os palestinos, e nem será”.
> leia mais (inglês) >
- ‘No diplomatic process with the Palestinians,’ source close to Bennett says after Gantz meets Abbas
- Biden, Bennett statements prove: Actors in U.S. change, but the show must go on
- Bennett-Biden meeting opened no doors, but left a crack for the Palestinians
Tradução: “Eu sou o primeiro-ministro e eu aprovo as coisas. Só falamos com Abbas sobre questões de segurança – segurança é importante, você pode discutir sobre isso. Então, não se preocupe. Não estamos conversando com eles sobre paz, d’us nos livre. E nunca iremos”.
Bennett é um primeiro-ministro que particularmente não deveria estar engajado em batuques populistas com sua base – pelo simples motivo de que ele não tem base. É um primeiro-ministro que assumiu o poder devido a circunstâncias únicas, mesmo tendo um número minúsculo de cadeiras no Parlamento.
E, mesmo assim, em vez de ser um líder firme, como as circustâncias lhe permitem caso ele queira, ele insiste em cortejar eleitores que não tem, sobre coisas que não são apenas inevitáveis, mas que também são a coisa certa a fazer.
Em vez de imitar a hipocrisia de Netanyahu nestas questões, Bennett deve dizer ao povo a verdade: Não temos como ignorar a Autoridade Palestina, nem devemos fazê-lo. Ela vive entre nós e ao nosso lado, e sempre será assim. Nós precisamos encontrar uma solução para o conflito, não fugir dele.
A História nos deu uma oportunidade excepcional para trabalhar sem estarmos atados por compromissos populistas, e podemos usar isto para o futuro de todos nós.
Mas ele é incapaz de fazer isto. Ele é um refém da sua base imaginária.
[ por Noa Landau | publicado no Haaretz de 30|08|2021 | traduzido pelo PAZ AGORA|BR ]