Três generais na reserva, todos veteranos de muitos anos de serviço nos territórios ocupados, foram entrevistados nesta semana na rádio e TV, após violentos ataques contra soldados no assentamento de Yitzhar e seus postos avançados ilegais. O antigo chefe do Comando Central Gad Shamni disse não estar surpreso pela violência, observando que ela podia deteriorar.
“No final, alguém irá atirar em soldados do EDI. É só questão de tempo”, disse (predições igualmente sombrias foram feitas durante o desligamento de Gaza em 2005, mas até agora não s concretizaram).
O Major-General (res.) Noam Tibon, antigo comandante da Divisão de Judéia e Samária, descreveu os atacantes como terroristas que devem ser mandados para prisão. “As respostas não são suficientemente fortes”, disse.
Avi Mizrahi chefiou o Comando Central do Exército no início desta década. No ano passado coordenou um comitê interministerial nomeado pelo então Ministro da Educação Naftali Bennett, encarregado de encontrar métodos educacionais para lidar com o problema da “juventude das colinas”.
Numa entrevista para a Kan News, Mizrahi explicou o pano de fundo político para o fracassado tratamento sistêmico da violência dos elementos da extrema-direita. “Por que fingir-se de inocente”? perguntou. “Havia aqui um governo de extrema-direita radical, com parte da sua base residindo aqui. Ele não queria adotar medidas extremas. Tão logo você decida lidar com a direita de Yitzhar, irá perceber que não tem apoio para isto.
A pessoa que hoje usa as botas de Shamni e Mizrahi é o Major-General Nadav Padan. Entre Mizrahi e Padan houve dois outros chefes do Comando Central: Nitzan Alon e Roni Numa. Ambos queimaram seus dedos no conflito com os colonos. Suas nomeações para posições mais altas, como chefes da Inteligência Militar (Alon e depois Numa) ou mesmo para chefe de gabinete (Numa), foram cogitadas, mas negadas, parte devido à oposição da direita, e num caso, pelo próprio Netanyahu.
Padan tentou uma abordagem um pouco diferente. Investiu uma parte significativa do seu tempo em conversa com líderes dos colonos na Cisjordânia, em conselhos regionais e assentamentos específicos. Os resultados, como se viu nesta semana, não foram um grande sucesso.
Os líderes dos colonos condenaram o apedrejamento e ameaças de soldados em Yitzhar e adjacências. Mas naquele assentamento havia um considerável grupo que apoiava os extremistas. Como usual, existe um número não declarado relacionado a esses incidentes,
Ataques violentos contra palestinos não merecem condenação (salvo em casos excepcionais de assassinato, como o da família Dawabshe no vilarejo de Duma há quatro anos); o ataque a ativistas de esquerda sempre pode ser descrito como um exagero ou armação; atacar policiais e agentes da Administração Civil não são a mesma coisa que atacar soldados de elite da divisão Golani.
Yitzhar não é um fenômeno isolado, como tentaram apresentar nesta semana. Bem na semana passada, colonos apedrejaram uma força chefiada pelo comandante da brigada regional e feriram levemente um agente da Administração Civil num incidente em postos avançados ilegais no Vale de Shiló, a norte de Ramallah.
No ano passado, ao negociar com colonos de Yitzhar, o exército recomendou em cinco ocasiões a demolição de um trailer que alojava jovens extremistas no posto avançado ilegal de Kumi Ori, perto de Yitzhar, que foi o foco do incidente desta semana. Os políticos bloquearam esta recomendação. Em todas as cinco vezes.
Na quinta-feira, uma demolição parcial foi aprovada para outro posto avançado ilegal. O que Mizrahi disse é bem compreendido por oficiais que estão servindo nessas áreas. Numa estação interminável de eleições, há uma evidente indisposição de político contrariarem a direita radical,
A isto, deve-se adicionar a corrente incompetência das agências de aplicação de lei. A atitude excessivamente condescendente adotada pela Justiça face os ativistas violentos de direita é reconhecida há décadas.
Um ativista chamado Neria Zarug recebeu um mandado de remoção da Cisjordânia. A polícia por algum motivo não consegue localizá-los. Mesmo que parece que ele não faz qualquer esforço para se esconder. No início desta emana, ele foi fotografado durante as celebrações de Simchat Torá em Yitzhar. Ao lado dela aparece o chefe do Conselho Regional da Samária, Yossi Dagan, sujeito muito influente no Comitê Central do Likud.
Ervas Daninhas no Jardim
O exército estima que o núcleo dos “jovens das colinas” não exceda 200 ativistas, muitos deles menores. Um quarto deles são considerados violentos e 10% foram marcados como pessoas que poderiam atacar fisicamente agentes de segurança. Entretanto, por trás desses há um grupo maior e mais extenso que expressa apoio ou pelo menos alguma simpatia por sua ideologia e suas ações violentas.
Há visivelmente outra consideração em questão aqui, que não costuma ser mencionada em público. No caso de Yitzhar, não há dúvida de que a juventude violenta dos postos avançados ilegais está dando uma má reputação aos assentamentos. Por que eles não estão sendo removidos? Não é só por causa de alguma simpatia por eles ou por medo.
O cenário mais extremo que ameaça Yitzhar, que por enquanto parece totalmente teórico, é uma evacuação forçada pelo Estado. Neste caso esses bandidos ganharão alguma proteção.
O governo, polícia e o exército sabem que qualquer tentativa de evacuar Yitzhar irá custar caro e envolverá violência. De fato, a deterrência está funcionando, espelhada na indisposição para demolir as construções ilegais e na atitude de oficiais evitarem confronto direto com esse grupo violento. Mas a tentativa de distinguir entre níveis de violência suportáveis (contra palestinos) ou completamente proibidos (contra soldados), está condenada a acabar mal,
Nesta semana há um outro lembrete disto, dentro do EDI. A detenção de 13 soldados do Nahal ultra-Ortodoxos foi prorrogada. Eles são suspeitos de envolvimento numa briga em que um trabalhador beduíno foi atacado num posto de gasolina no Negev. Os soldados dizem que ele os insultou com slogans ultra-nacionalistas árabes. Se as suspeitas contra esses soldados forem confirmadas, será mais uma prova da dificuldade de traçar uma linha vermelha ao longo da Linha Verde (fronteira de 1967), ou seja, de restringir a violência aos territórios ocupados.
Para os soldados, um cidadão beduíno seria como um palestino que joga pedras e seu tratamento seria o mesmo. Como num caso similar no início do ano, quando presos palestinos foram abusados no mesmo batalhão, há sinais de uma conspiração de silêncio e uma cobertura por jovens comandantes.
[ por Amos Harel | publicado em 26|10|19 no Haaretz | traduzido pelo PAZ AGORA|BR
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