Arrependimentos – no sentido profundo judaico – significa ‘lamentar o passado e tomar resoluções para o futuro”. A qual passado nos referimos quando falamos sobre a ocupação? 1967? 1948? A formação do sionismo? Ou talvez até antes disso?
Por não ser claro o passado, lamento também, é igualmente embaçado. O que exatamente eu lamento? Serão minhas ligações a um território que não é exclusivamente meu? É a mão pesada e a opressão violenta? É a supressão de liberdades civis e a diminuição das esperanças por paz entre ambas as nações? E quanto às resoluções futuras: a que exatamente estou comprometido? Dois Estados? Um Estado?
No meio de todo este caos que cega, o que é necessário é iniciar a conversação desde o zero. Ignorar, por um momento, todo o ruído do passado da História (não se preocupe, ele não sumirá e voltaremos a ele) e iniciar a criação entre o rio e o mar de novo.
A primeira fundação sobre a qual nosso novo mundo será construído é um simples princípio humano – que todas pessoas vivendo neste lugar são elegíveis aos mesmos direitos humanos básicos: o direito de viver em dignidade e igualdade, o direito de influenciar sua vizinhança através do poder do voto, o direito à liberdade e manifestação.
A segunda fundação é parceria. Devemos superar o paradigma no qual todas as soluções existentes foram baseadas: divisão, separação e privilégios discriminatórios. Em vez disto, precisamos buscar um espaço compartilhado, direitos compartilhados e recursos – e nesses ponto podemos parar de contar o número de estados com que terminaremos (um, dois ou mais) e começar a contar direitos e liberdades. Quanto mais, melhor.
Só então poderemos voltar aos livros de História – não para decidir qual perspectiva é “correta”; não para decidir quem está certo e quem está errado – mas, utilizar o novo futuro que criamos de forma a aceitar todos os passados.
Não um passado. Dois. Devemos aceitar a realidade formada por dois grupos nacionais vivendo lado a lado, que reconhecem suas narrativas separadas de eventos passados. E mesmo assim são capazes de trabalhar juntos por um futuro melhor. A resposta à ocupação deve, portanto, ser um futuro no qual faremos de tudo para consertar as injustiças de ontem, sem arruinar novamente a possibilidade de um amanhã melhor.
O texto de Avraham (Avrum) Burg foi publicado pela ONG Breaking the Silence breakingthesilence.org, como parte de uma série de leituras para os “Dez Dias de Arrependimento/Iamim Noraim, entre Rosh Hashaná e Yom Kipur. Na tradição judaica este período é dedicado à introspecção e reflexão obre as transgressões que cometemos durante o ano.
Avraham (Avrum) Burg foi cofundador do Movimento PAZ AGORA e ocupou diversas vezes a cadeira de Deputado do Knesset, do qual chegou a ser presidente. Comandou também o Keren Hakaiemet Leisrael, e teve uma coluna fixa no Yediot Achronot onde interpretava a passagem semanal da Torá. Participou das negociações que culminaram na Iniciativa de Genebra em 2002.
Seu pai Joseph Burg, que fundara o Partido Nacional Religioso de Israel, foi um dos redatores da Declaração de Independência de Israel.