Anexar o Vale do Jordão é Loucura

 

GENEVA MAP

O Tratado de Paz de 1994 entre Israel e Jordânia incluiu duas cláusulas cuja importância para a segurança é tão grande ou talvez maior que a desmilitarização da Península do Sinai no Tratado de Paz como Egito. Essas cláusulas tornam a intenção do presidente do Kahol Lavan, Benny Ganz e a demanda do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, de anexar o Vale do Jordão a Israel uma piada de mal gosto, mostrando falta de responsabilidade nacional.

A primeira, a Cláusula 4 do artigo 4, proíbe Jordânia e Israel de assinara acordos militares com Estados ou organizações hostis à outra parte, ou “permitir a entrada, acantonamento e operação nos seus territórios, ou através deles, de forças militares… em circunstâncias que podem prejudicar adversamente a segurança da outra Parte”. Em outras palavras, baseados na hipótese de trabalho de que o exército jordaniano pretenda ou possa ameaçar Israel. A real fronteira de segurança de Israel não é o Rio Jordão, mas a fronteira da Jordânia com Iraque, Síria e Arábia Saudita, que ficam a centenas de quilômetros dos centros populacionais de Israel. Esta cláusula dá a Israel uma profundidade estratégica maior do que a que o Movimento Sionista jamais buscou em qualquer demanda desde a Conferência de Paz de Versailles em 1919.

O ‘buffer’ de segurança nas colinas orientais da Samária e no Vale do Jordão nasceu do temor israelense após a Guerra dos Seis Dias, de uma invasão por terra ao longo do “potencial front oriental”, pelos exércitos da Jordânia, Síria e Iraque. Este front acabou desaparecendo, começando com a destruição dos mísseis terra-ar no Vale de Bekaa do Líbano e a derrubada de 86 aviões sírios na Primeira Guerra do Líbano, através da cessação de embarques gratuitos de armas da Rússia para a Síria devido à queda da União Soviética em 1988, o Tratado de Paz com a Jordânia em 1994 e a conquista do Iraque em 2003, terminando com a guerra civil na Síria desde 2011.

Qualquer oficial novato da inteligência sabe que o Irã não pode nem pretende enviar forças blindadas para Israel, o que demandaria cruzar 1.500 km do deserto da Arábia, exposto à Força Aérea de Israel, numa região inteiramente sunita.  Há ainda o fato de que em Israel, onde metade dos professores não sabe com quais países tem fronteiras (conforme uma pesquisa de 2015 do Gal Institute) e cerca de um terço dos seus estudantes não sabem qual a capital da Síria (baseado numa pesquisa de 2003 com escolas secundárias de Jerusalém), filmes de propaganda  são lançados com sucesso, retratando o Vale do  Jordão como uma barreira natural para tanques do leste.

A ameaça contra Israel é de fato descrita correntemente como infiltração e propagação do terror vindo da Jordânia através do Vale do Jordão para o futuro Estado Palestino e dali para Israel. Esta ameaça, também, foi endereçada com respostas muito valiosas, como elucidado na segunda significante cláusula do Tratado de Paz com a Jordânia.

A Cláusula 5 do artigo sobre segurança determina: “Ambas as partes tomarão as medidas necessárias e efetivas e irão cooperar no combate ao terrorismo de todos os tipos. As Partes se comprometem a tomar as medidas necessárias e efetivas para impedir atos de terrorismo, subversão ou violência a partir do seu território ou através dele e a tomar as medidas necessárias e efetivas para impedir atos de terrorismo e a tomar as medidas necessárias e efetivas para combater tais atividades e seus perpetradores”.

Comandantes de brigada no Vale do Jordão e chefes do Comando Central irão atestar que o exército jordaniano, acantonado a leste do Rio Jordão, cumprirão seu trabalho fielmente. Este sucesso permitiu e continua permitindo a Israel gozar uma fronteira estável e cala e a limitar significativamente o número de suas tropas ao longo da fronteira.

Segundo, no escopo das negociações entre Israel e a OLP, a última concordou que Israel poderia deixar uma presença milita no Vale do Jordão por alguns anos, permitir. entre outras coisas, que  as forças de seguranças palestinas organizem na Cisjordânia, após a retirada do EDI e a evacuação de colonos como parte de um acordo permanente.   Além disto, os palestinos concordaram com a permanência acordada de forças de terceiros. Mahmoud Abbas propôs que forças americanas, aceitáveis para Israel, assegurem a desmilitarização do Estado Palestino e supervisionem seus pontos de entrada.

O argumento de que os dias do Reino Hashemita estão contados têm sido ouvidos há décadas. Yigal Alon, que propôs imediatamente após a Guerra dos Seis Dias estabelecer um Estado Palestino na Cisjordânia, descartou conversações do o Rei Hussein porque “Hussein não deveria ser visto como eterno…. hoje é Hussein, amanhã [o esquerdista jordaniano e ex-primeiro ministro Suleiman] Nabulsi e depois de amanhã algum sírio irá removê-lo”. A falta de estabilidade, como vemos na Síria, ou vimos nas rápidas mudanças de regime no Egito em 2012, com a ascensão da Fraternidade Muçulmana, é um risco muito razoável que é preferível a cancelar os Tratados de Paz com Egito e Jordânia – caso Netanyahu cumpra sua promessa de anexar o Vale do Jordão unilateralmente.

Gantz também deve saber que os palestinos não querem e nem podem renunciar à fronteira com a Jordânia. Eles não podem abrir mão de 30% da Cisjordânia sem nada em troca. E pretendem assentar no Vale do Jordão os poucos refugiados que retornarão ao Estado Palestino como parte de um acordo permanente.

Ele deve trabalhar para reduzir a pressão que se espera seja colocada sobre o Rei, o povo e o parlamento jordaniano contra a contínua normalização e cooperação de segurança que a Jordânia mantém com Israel, face à falta de progresso das negociações palestinas.  Ele deve trabalhar para interromper apelos no Knesset e no governo para ver a Jordânia como a “Pátria Palestina”, para dar cidadania jordaniana a residentes da Cisjordânia e mesmo expulsar massas de palestinos no calor da próxima guerra – chamados que são percebidos na Jordânia como um golpe contra o Tratado de Paz e uma ameaça para seu futuro, porque irá minar a estabilidade do reino e de sua economia frágil.

Sem renovar negociações com os palestinos, baseadas nos parâmetros fixados pelo primeiro-ministro Ehud Olmert e o presidente Abbas em 2008 nas conversações de Annapolis, um cancelamento do Tratado de Paz com a Jordânia, que é bom para Israel (e para a Jordânia) pode transformar-se no pior passo da parada de estupidez de Netanyahu e seus sucessores com respeito à segurança de Israel e sua integração na região.

O Coronel(res.) Dr. Shaul Arieli é autor de “A Border between You and Us” e “All of Israel’s Borders.”  Liderou a equipe de negociação de Ehud Barak e atuou na elaboração e discussão da Iniciativa de Genebra. É considerado um dos maiores experts israelenses  nas questões de demarcação de fronteiras e na rota da Barreira de Separação.[ Publicado no Haaretz em 04|10|19 Traduzido pelo PAZ AGORA|BR ]

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Fronteiras no Plano de Paz Olmert-Abbas

Fronteiras no Plano de Paz Olmert-Abbas

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