No mês passado, a Internet foi inundada por rumores de que o ex-presidente de Israel Shimon Peres havia falecido. Mostrando disposição, o homem que incansavelmente elogia o setor de high-tech do país foi ao Facebook para desfazer os rumores.
“Eu quero agradecer aos cidadãos de Israel pelo apoio, preocupação e interesse, e desejo esclarecer que os rumores são falsos”, disse Peres, ganhador do Prêmio Nobel da Paz. “Continuo com a minha agenda diária, como sempre, para fazer o que possa para ajudar o Estado de Israel e seus cidadãos”.
Lutou por Israel ainda antes que o Estado existisse, liderou seus soldados nos anos de sua formação e fundou dois dos primeiros kibutzim do país. Peres, agora com 92 anos, é o último homem que resta da geração dos líderes que construíram Israel.
Nomeado diretor-geral do Ministério da Defesa em 1953, aos 29 anos, a carreira política de Peres continuou por sete décadas terminando, há cerca de um ano, com a conclusão de seu mandato de sete anos como presidente.
E quando Peres anunciou que ainda estava vivo, ele quis dizer que está muito vivo — e ainda muito ativo. Num dia típico, ele se levanta às 4:30 da manhã para ler e “fazer esporte” (ele caminha numa esteira). Às 8:30 ele está no seu escritório e trabalha frequentemente até as 11 da noite.
Falando à JTA do Peres Center for Peace, a ONG que fundou em 1996 para promover a coexistência, Peres conversou sobre a razão de estar mais ocupado do que nunca — e por que ele ainda não desistiu da paz.
JTA: Faz mais de um ano que o senhor deixou a política. Como o senhor preenche agora os seus dias?
Shimon Peres: O Peres Center for Peace está trabalhando pela paz e pela inovação em todo o mundo. O centro já tem 20 anos e um saldo brilhante.
Um dos seus programas é chamado Saving Children [salvando crianças]. Descobri que 2.000 crianças palestinas foram feridas durante a intifada. Decidimos trazer todas para Jerusalém e elas foram curadas. Isto feito, pais de outras crianças palestinos vieram a nós e disseram: ‘Meu filho não foi ferido na guerra, mas tem um problema no coração ou na cabeça. Por favor, nos ajude’. Nosso resultado até agora é de 11.000 crianças curadas em hospitais de Jerusalém, por nossa conta.
Há dois meses, marcaram-se 20 anos desde o assassinato de Yitzhak Rabin. Se o senhor pudesse falar com ele agora, o que pensa que ele diria sobre o Estado de Israel de hoje?
Nós iríamos continuar o que fizemos. Nós começamos a fazer a paz. Começamos com a Jordânia, fizemos a paz com os egípcios e iniciamos com os palestinos. [O processo de paz] não foi completado, mas devemos continuar a fazer o mesmo.
Penso que a nossa segurança, o nosso bem-estar e o nosso caráter judaico demandam a paz. Se não conseguirmos a paz, estaremos sempre envolvidos em guerras e terror. E eu acho que é possível. Acho que podemos alcançar a paz.
A despeito dos ataques terroristas, não podemos diminuir nossos esforços para fazer a paz. Não podemos responder a uma faca com outra faca. Não penso que possamos viver se apenas continuarmos tentando destruir um ao outro,
Muitos árabes entendem isto, o que podemos ver agora. Por muitos anos, a atitude árabe era refletida pela Resolução de Cartum, que nomeava três nãos: não reconhecer Israel, não negociar com Israel e não fazer a paz com Israel.
Isso acabou. Agora há projetos de paz árabes. Há um projeto saudita, um projeto da Liga Árabe. Eles estão falando sobre paz, e isto é uma mudança importante. Talvez seus planos não sejam exatamente o que procuramos, mas existe uma grande diferença entre aquela recusa organizada a fazer a paz com Israel e as tentativas de fazer uma ponte entre as partes.
Israel tem um parceiro para a paz?
Sim, nós temos um parceiro. Mas temos que decidir — queremos um parceiro para a paz ou um parceiro para a guerra? Estou falando de Abu Mazen [o presidente Mahmoud Abbas da Autoridade Palestina].
Ele fala sobre paz, fala contra o terrorismo. Ele não fala a linguagem sionista, nem espero que ele o faça. Ele tem uma força policial de 15.000 pessoas que, de fato, estão lutando contra o terror.
O senhor acha que Israel não fez o suficiente para aproveitar este parceiro para a paz?
Não quero olhar para quem devo culpar. Não estou interessado nisto. Estou mais interessado em olhar para quem eu possa elogiar por lutar pela paz.
Eu sei que a paz é difícil de alcançar. Digo por experiência própria. As pessoas chegam e me falam, ‘Você está certo, precisamos pagar um preço’. Mas também dizem. ‘Por que você está pagando tanto? Por que você é tão ingênuo para confiar tanto neles?’
Há duas coisas na vida que, se você realmente quer conquistar, tem que fechar um pouco os olhos: – A paz e o amor. Com os olhos totalmente abertos, duvido que alguém possa se apaixonar, e estou seguro que ninguém faria a paz.
Mas, quando você compara para saber qual o melhor, viver em paz e viver com amor, mesmo que não seja perfeito, são de longe as escolhas certas.
O que o senhor acha que o surgimento de ataques por árabes-israelenses diz sobre o Israel de hoje?
Eles tem direitos iguais. Não há apartheid em Israel. Mas eles se sentem discriminados porque o padrão de vida dos israelenses judeus é mais alto do que o dos árabes. O que precisamos fazer é promover o padrão de vida deles. Acho que podemos fazê-lo e devemos fazê-lo. É isto que estamos fazendo no nosso Centro.
Israel já foi uma questão claramente bipartidária nos Estados Unidos, mas existe hoje alguma evidência de que os republicanos tendem mais a apoiar Israel quando seu interesse diverge do americano. O que pode ser feito para mudar isto?
Acho que devemos nos esforçar pelo apoio dos dois partidos. Não devemos tomar um lado em questões internas dos americanos. Devemos apreciar que a amizade dos Estados Unidos vem dos dois partidos. E para isto não podemos mostrar envolvimento na política norte-americana, assim como os americanos são cautelosos para não mostrar envolvimento na política israelense.
[ entrevista por Yardena Schwartz publicada em 12|01|2015 pela JTA (Jewish Telegraphic Agency) e pelo Times of Israel e traduzido pelo PAZ AGORA|BR ]