O significado do apoio de árabes-israelenses ao Hizbolá
Yossi Alpher – analista judeu-israelense
O ‘índice mensal ‘Peace Index’ publicado pelo Tami Steinmetz Center for Peace Research, da Universidade de Tel Aviv, revelou que, no período de 31/7 a 1/8, 68% dos cidadãos árabes de Israel definiam a guerra de Israel no Líbano como injustificada e 79% diziam que os ataques aéreos de Israel sobre o Líbano eram injustificados. 56% julgavam confiáveis as declarações de Hassan Nasralá, enquanto 53% não confiavam nos relatórios do exército israelense.
Esses resultados a grosso modo correspondem a declarações feitas à mídia por cidadãos árabes israelenses sob fogo no norte. Só uma pequena minoria daqueles diretamente afetados pelos ataques de foguetes lançados desde o Líbano falou contra o Hizbolá, enquanto a maior parte condenou Israel ou adotou uma posição neutra condendo a guerra e a destruição mútua e apoiando um cessar-fogo imediato.
No Knesset, também, após um rotundo silêncio inicial, os dez representantes de partidos árabes falaram com raiva contra o esforço de guerra de Israel e obtiveram respostas furiosas de políticos israelenses e da imprensa, que chegaram até a aventar formas de destituí-los de sua cidadania.
A disposição de uma significativa maioria dos árabes-israelenses, predominantemente muçulmanos sunitas, de se identificar com um movimento xiíta libanês que rejeita o direito de Israel existir e bombardeia indiscriminadamente o norte israelense – que tem entre sua população cerca de 50% de árabes – pede reflexão.
Estes resultados visivelmente contradizem aqueles de pesquisas rotineiras feitas nos últimos anos, que indicam uma crescente disposição entre cidadãos palestinos de Israel a se acomodar, de alguma maneira, com Israel enquanto Estado de natureza judaica. E claramente são discrepantes do apoio de 80 a 90% dado ao esforço de guerra no Líbano pela população israelense como um todo.
Na verdade, o único momento em que ouvimos objeções sérias e abertas de árabes-israelenses a Nasralá foi quando ele aconselhou os moradores árabes de Haifa a deixar suas casas temporariamente para evitarem prejuízos, admitindo implicitamente que detinha pouco controle sobre onde os seus foguetes caíam.
De fato, após 17 mortes (até 10/8) e dezenas de feridos em comunidades árabes de Haifa a Nazaré e Mrar, poucos israelenses árabes deixaram suas casas (diversamente de moradores judeus do norte, a maior parte dos quais se mudaram para o Sul quando podiam), atestando assim sua determinação em não ser novamente removidos como foram os palestinos em 1948.
Este comportamento não impediu as comunidade árabes atingidas pelos foguetes de se queixar que o governo não lhes tinha fornecido previamente dispositivos de alarme e abrigos. O governo claramente não levara em conta o quão imprecisos eram os foguetes do Hizbolá e quão indiscriminada poderia ser a campanha de foguetes de Nasralá, a ponto dele bombardear uma população que simpatizava com o seu lado.
No final das contas, a comunidade israelense árabe reagiu à guerra mais ou menos como as ‘ruas’ árabes em qualquer lugar do mundo, seja no Cairo ou no Kuwait. Os árabes israelenses também tiveram uma razão especial para preocupação, em vista do grande número de refugiados palestinos no Líbano que foram afetados pelos bombardeios de Israel.
Os setores beduínos e drusos, que servem no exército israelense e são mais identificados com o Estado, em vários momentos expressaram abertamente críticas ao Hizbolá e apoio ao esforço de guerra israelense. A minoria cristã manteve silêncio.
Mas a grande maioria muçulmana dos cidadãos palestinos de Israel se opôs ao esforço de guerra israelense até mesmo quando o Hizbolá disparou foguetes sobre eles e apesar do fato de uma série de governos árabes moderados terem assumido abertamente o seu distanciamento de Nasralá. Isto representa uma ampliação palpável da cisão interna entre árabes e judeus em Israel.
Mesmo que retornemos – e devemos todos sem dúvida nos apressar em voltar – aos nossos diversos modos de coexistência pacífica quando esta guerra terminar, a questão não deve ser varrida para baixo do tapete. O Hizbolá, com o apoio do Irã, recrutou com sucesso nos últimos anos vários agentes árabe-israelenses. Agora precisamos reconhecer que ele também progrediu na conquista de corações e mentes de cidadãos palestinos de Israel.
A distância dificilmente irá desaparecer meramente pelo incremento de dotações orçamentárias do Estado israelense à população árabe, embora este seja um passo muito necessário. Mas será exacerbada, sem necessidade, por chamamentos panfletários a boicotar ou desqualificar lideres da comunidade árabe-israelense.
Por outro lado, este distanciamento poderia potencialmente ser seriamente diminuído pelo sucesso de uma solução para o conflito palestino, cujo impasse Nasralá está explorando com grande competência. Só que isto não deve acontecer logo…
© bitterlemons.org 14|08|2006 versão brasileira autorizada PAZ AGORA|BR
Yossi Alpher co-editor da bitterlemons.org, bitterlemons-international.org e da bitterlemons-dialogue.org. Foi diretor do Jaffee Center for Strategic Studies e assessor do ex-primeiro ministro israelense Ehud Barak.
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