Entre os regimes do mundo ocidental, Israel se destaca por certas características que geralmente não indicam um forte sistema democrático.
Seu parlamento está paralisado, a oposição inexiste, e o desrespeito à lei está ficando mais pronunciado. Isto não se refere apenas à agitação causada pelos ultra-ortodoxos, mas também por algo muito mais perigoso: a inquietação provocada pelos colonos. A direita "respeitável" escolheu líderes perigosos, como Moshe Ya'alon, que apaga a linha entre elementos da cúpula do Likud e os "Feiglins" extremistas, e entre o partido de União Nacional e a extrema direita. Num futuro não muito distante, eles substituirão a liderança atual do Likud, a qual já é bem mais extremada que os veteranos revisionistas.
Mais ainda, a liderança política e as elites dominantes, incluindo a elite militar, demonstram uma preocupante falta de talento. Deste a segunda guerra do Líbano até a flotilha de Gaza – incluindo a operação 'chumbo fundido', as derrotas de Israel vem sendo maiores do que os sucessos.
Neste cenário, a crise moral de Israel vai se aprofundando. A sociedade israelense está se desintegrando em camadas e blocos que têm visões de mundo e perspectivas históricas totalmente diferentes. Cada vez mais, esses blocos hostis carecem de objetivos nacionais convergentes.
A desintegração moral e intelectual também contribui para a perda gradual da solidariedade social e da responsabilidade mútua. O afastamento entre as partes da sociedade que diferem sobre o futuro político do do país está aumentando, não menos que a alienação entre extratos sociais e setores da população cujo tipo de vida é tão diferente como o leste do oeste.
Todos esses fenômenos precisam ser abordados, inicialmente a nível político. Assim, para que a mudança seja possível, um motor político é necessário.
Lamentavelmente, este tipo de máquina não mais existe por aqui. Conduzido por Shimon Peres e Ehud Barak, o partido trabalhista Avodá traiu seu papel. Está indo rumo a sua auto-liquidação. A deserção de Peres para o Kadima, nas eleições de 2006, foi só um sintoma da doença mas, naquela ocasião, a profundidade da degeneração foi revelada.
Teria havido muitas instâncias no mundo democrático, nos últimos 50 anos, onde um líder de partido tivesse desertado dele por um rival, meramente por ter sido derrotado nas primárias às vésperas da eleição?
Peres, o desertor, que se tornou presidente, e Dalia Itzik a desertora, que foi porta-voz do Knesset até as últimas eleições, ensinaram ao israelense comum que a política é uma esfera que se deve evitar, caso se deseje salvar a alma, que a vida política não é nada além de uma rede de fraudes – sem ideologia, princípios ou verdade.
O herdeiro de Peres, Ehud Barak, está contribuindo para este sentimento: ele está liquidando o que resta do direito de seu partido existir. Podemos agradecer a Barak pela retumbante desgraça da operação 'chumbo fundido', que arrancou mais uma camada da antiga identidade israelense.
E estamos em débito com ele pela humilhação que sofremos no incidente da flotilha de Gaza. Além disto, Barak é um apoiador do neoliberalismo e da privatização. Opõe-se ao aumento do salário mínimo e – por sua própria participação no governo – apóia a educação religiosa nas escolas seculares. Quem precisa dele ou do seu partido?
Vale mencionar que Barak, em virtude da sua posição como ministro da defesa, é também o governador militar da Cisjordânia.
Espectadores do noticiário do Canal 10 nesta 6ª feira ficaram admirados ao ver uma cena que parecia pertencer ao mundo das alucinações: para encurtar o percurso dos judeus de Hebron para a Caverna do Patriarcas, as janelas das casas árabes onde passariam os religiosos foram lacradas. É preciso esfregar os olhos para acreditar como o poder colonial se permite tornar tão insuportável a vida da população local. Não apenas suas janelas foram lacradas, mas o acesso às suas casas foi tornado especialmente difícil – apenas para a conveniência dos ocupantes.
Não foram os religiosos que lacraram as casas, mas o exército que lá está para servi-los, e o comandante em chefe do exército é o líder do partido Avodá.
Muita gente deixará de apoiar o Avodá nas próximas eleições, mas é duvidoso se isto assustará Barak.
Como Peres tempos atrás, ele também não se aposentará. Em vez disso, é razoável esperar que ele continuará na mesma profissão – só que no lado oposto da rua.