Enquanto um novo presidente americano prepara-se para assumir o cargo, e Israel caminha para novas eleições, o governo israelense anunciou uma “solução de compromisso” sobre o outpost ilegal de Migron, na Cisjordânia.
O trato torna ridículas as promessas oficiais de lidar a sério com a atividade de assentamento ilegal. Também afronta a seriedade do compromisso de Israel em chegar a uma paz com os palestinos. Para entender isto, é preciso examinar atentamente os detalhes ocultos sob o anúncio.
Os Fatos
Em dezembro de 2006, o governo israelense reconheceu perante a Justiça que Migron – o estandarte do movimento de criação de outposts – era ilegal e que seus moradores nada mais são do que ladrões de terras privadas palestinas, que devem ser evacuados.
Após postergar a ação de despejo, tentando contemporizar com os colonos infratores da lei, o governo chegou agora a um acordo com os seus líderes: a realocação futura de Migron para um local dentro da área municipal do assentamento de Adam, na Cisjordânia ocupada.
Tal compromisso transforma o que deveria ser uma demonstração da seriedade do governo israelense em coibir ações de colonização ilegal em – ao contrário – um mecanismo de legalizar tais ações. Mais acintosamente, abre um perigoso precedente para o governo: a expansão de um assentamento localizado a leste da barreira de segurança, visando sua futura anexação a Jerusalém. Algo que traria graves conseqüências para a viabilidade de uma solução israelense-palestina de dois Estados.
Razões Ocultas
Adam é um assentamento isolado com cerca de 2.500 habitantes, afastado a nordeste de Jerusalém. Sua área construída está a cerca de 7 quilômetros da Linha Verde e cerca de 1,5 quilômetro dos limites municipais de Jerusalém. Mas estes números não contam toda a história. Perto de Adam, a barreira de segurança mergulha profundamente dentro da Cisjordânia, deixando Adam no lado da Cisjordânia e anexando a Israel quase toda a área vazia a seu Oeste.
Críticos advertiram que a única justificativa para esta perversão é política: abrir caminho para a construção de assentamentos que ligariam Adam a Jerusalém, bloqueando qualquer desenvolvimento palestino naquela região.
Adam seria massivamente expandida pela terra anexada. As obras planejadas acomodariam mais de 1.000 unidades residenciais, absorvendo mais 5.000 colonos. Deixariam Adam ultrapassando a barreira, e criariam um bloco contíguo de assentamentos judeus a Oeste desde Adam até o grande assentamento de Nevê Yaakov, 7 quilômetros mais distante. Um novo traçado da barreira de segurança para abranger o resto de Adam seria quase um fato consumado.
O ‘Projeto 240/3’ (que está na gaveta aguardando aprovação do governo) e a negociata de Migron lançam em descrédito a popular frase – muito invocada por autoridades israelenses – de que ‘logicamente, os assentamentos localizados além da barreira serão um dia removidos’. Revelam também intenções muito problemáticas para o norte de Jerusalém: ligar assentamentos no lado israelense da barreira a assentamentos isolados no cerne da Cisjordânia, anexando de fato a Israel esses assentamentos e terras no entorno.
Perigo para Solução de Dois-Estados
Na realidade atual, incorporar a Israel assentamentos judeus que estejam dentro dos limites municipais de Jerusalém ainda é compatível com uma solução da questão de Jerusalém, segundo os parâmetros Clinton e os entendimentos informais alcançados em Taba e pela Iniciativa de Genebra.
Mas a expansão desses assentamentos – e particularmente a ligação deles a outros situados fora da barreira – ameaça a viabilidade de tal solução. A ruptura da contigüidade natural entre as áreas palestinas de Jerusalém e da Cisjordânia é incompatível com qualquer acordo possível de paz.
Ilegal, por qualquer critério.
Sob a lei israelense, o outpost deve ser eliminado e não realocado para outro local na Cisjordânia. E menos ainda para Adam, onde seria um novo obstáculo para a solução de dois Estados. Tal medida iria apenas premiar os atos ilegais de colonos e estimular novas desobediências à lei.
Os colonos de Migron são infratores da lei, e qualquer inconveniência causada por seu despejo é de sua própria responsabilidade.
Já foi ruim o suficiente que Israel tenha ignorado a instalação dos assim-chamados outposts e outras transgressões dos colonos. É bem pior fingir que se está tomando uma atitude contra essas ilegalidades, quando na verdade se oferece uma lavagem dos crimes dos colonos, fortalecendo-se como ferramentas de um esquema de colonização bem maior e mais perigoso.
É hora de Israel parar de ajudar e se acumpliciar dos colonos em seu empenho para destruir qualquer chance para um acordo de paz viável. A Suprema Corte de Justiça, a população israelense e a comunidade internacional precisam rejeitar a negociata de Migron e o subterfúgio que representa.
Lara Friedman é diretora de relações políticas e governamentais do APN – Americans for Peace Now;
Hagit Ofran dirige a Equipe de Monitoramento de Assentamentos do PAZ AGORA.
[ publicado no Haaretz em 28|11|08 – traduzido pelo PAZ AGORA|BR ]
COMUNICADO PAZ AGORA – 26|11|2008
A Suprema Corte de Israel ordenou ao Estado que explique, em 45 dias, a razão de não ter removido o outpost ilegal de Migron na Cisjordânia
A ordem foi proferida hoje durante sessão do tribunal, após dois anos de postergações do governo, que incluíram promessas de próximas evacuações e o anúncio na véspera de um acordo firmado com os próprios colonos de se removerem voluntariamente para o assentamento de Adam.
O PAZ AGORA apresentou à Corte uma declaração do Brigadeiro-General (res) Ilan Paz, que estimou que a construção de um novo bairro em Adam para alojar os evacuados poderia levar de 3 a 7 anos.
Em sua sentença, a presidente da Suprema Corte, Dorit Beinisch, criticou o Estado: “Hoje os senhores estão apresentando documentos cheios de promessas, mas sem saber quem de fato irá implementá-las dentro de três anos, suas declarações se tornaram palavras sem significado. Em suas declarações, os senhores revelaram alguns dos seus segredos: explicam como será realizada a evacuação, mas nunca dizem se fato ela será realizada”.