Nos últimos 30 anos tenho considerado os assentamentos como um fato destrutivo que levanta um grande ponto de interrogação sobre o futuro de Israel. O empreendimento de assentamento é um fenômeno ideológico, político e social que conseguiu criar uma criação andrógina original: o sionismo colonialista.
Já havia variações do sionismo: geral, revisionista, socialista – com ou sem aspas. Agora também temos o sionismo colonialista, baseado na desigualdade étnica e religiosa, que se considera como o emissário exclusivo da História judaica.
A promessa divina – e não os direitos naturais dos seres humanos à liberdade, independência e soberania – é, aos olhos deles, a única fonte de legitimidade para o retorno dos judeus à Terra de Israel.
Segundo esse ponto de vista, a terra pertence não apenas aos judeus vivos, mas a todas as gerações passadas e àquelas que ainda não nasceram. Assim, os membros da geração atual não têm o direito de dividir a posse da terra com membros de outra nação.
Deixemos claro que quando falamos dos “assentamentos” não estamos nos referindo àquela vasta maioria de israelenses que moram na Cisjordânia por razões de conveniência ou necessidade (moradia barata e melhor). Tampouco falamos de cada colono como indivíduo. Falamos sobre “empreendimento dos assentamentos” do jeito que se fala de “socialismo”, de “conservadorismo” ou “nacionalismo”. Em outras palavras, sobre o que é essencial à ideologia e ao movimento, e o tipifica.
Mesmo o núcleo ideológico do que, em essência, é o “movimento dos colonos” não tem apenas um matiz. Entre a juventude das colinas e muitos dos seus pais existe uma grande diferença, não apenas em termos de comportamento, mas também nos graus de conexão a valores universais.
Entretanto, de forma geral, são todos nutridos pelos mesmos princípios e aspiram pelos mesmos objetivos. Como esta pequena minoria está convencida de que é proprietária da verdade absoluta, ela se considera autorizada a impô-la sobre toda a sociedade;
Por isto, seus líderes e porta-vozes mostram desdém pelos políticos fracos e também pelos próprios elementos básicos da democracia. Sabem como explorar as instituições democráticas, mas ignoram direitos humanos e reconhecem apenas os direitos dos judeus. Desde a decisão da Suprema Corte de Justiça [de Israel] sobre Elon Moré em 1979, na qual a Corte sentenciou que tomar terras privadas é ilegal, eles vêm atacando esta instituição básica da democracia israelense, a guardiá dos direitos individuais..
Apesar do poder que adquiriu graças à covardia do governo, o colono ideológico sempre veste o manto de mártir perseguido pela elite de esquerda e pela mídia que controla. Embora controle os territórios, ele gosta de ser retratado como a vítima perpétua de conspirações de esquerda.
Embora por quase quatro décadas o colono ideológico tenha criado uma realidade sobre a qual os eleitores israelenses jamais foram chamados a opinar, e de formas subversivas tenha transformado a ocupação militar em controle civil – o que contradiz qualquer norma aceita no mundo ocidental – ele não para de gritar que foi roubado.
Em Hebron, criou-se uma situação que é uma desgraça nacional, um pecado e um crime: O apartheid – como recentemente escreveu o professor de direito Boaz Okun -. Mas não apenas em Hebron: a situação nos territórios em geral e nos outposts ilegais em particular, juntamente com o roubo de terras privadas de palestinos, são testemunhos da falência do Estado quando é confrontado com a obstinação do colono e sua determinação em não se refrear diante de obstáculos éticos ou legais.
A forma do movimento de colonos agir cria violações diárias à lei e uma cultura de violência. Ofra e Beit El podem ser lugares calmos e agradáveis colonizados por idealistas, mas somados aos seus postos avançados satélites, Amona, Beit Hagdud, Ofra Nordeste, Beit El Leste e a Colina 909, apossaram-se de uma área da qual mais de 90% é composta de terras privadas de palestinos, conforme fotos aéreas e informações de órgãos governamentais reunidas pela Equipe de Monitoramento do PAZ AGORA (dados de outubro de 2006).
Finalmente, gostaria de esclarecer um ponto de uma vez por todas. Sem qualquer ligação com o atentado feito contra mim por perpetradores que podem pertencer a qualquer facção da extrema-direita, e não necessariamente ao movimento de colonos.
Escrevi três artigos entre maio e junho de 2001. Em um deles, expliquei minha posição com relação aos colonos em um parágrafo que não foi adequadamente interpretado, Expliquei minha posição com relação aos colonos: As vidas dos judeus que vivem dos dois lados da Linha Verde são “igualmente preciosas”.
E em outro lugar: “O movimento dos colonos é um desastre histórico, mas lá vivem pessoas que precisam ser protegidas”. È fundamental distinguir entre aqueles indivíduos de quem devemos cuidar, enquanto estiverem ali – e enfatizo a dimensão de temporalidade – e o empreendimento de assentamentos como fenômeno histórico.
Já escrevi no passado neste jornal, e hoje o repito: se a sociedade israelense for incapaz de reunir a coragem necessária para por um fim aos assentamentos, os assentamentos porão um fim ao Estado de Israel e o transformarão num Estado binacional.
ZEEV STERNHELL – Publicado no Haaretz em 20|10|2008 e traduzido pelo PAZ AGORA|BR–