O amigo de quem Israel precisa

 O presidente Bush esteve neste canto do mundo no mês passado. Tive a oportunidade de comparecer a dois dos seus discursos, um no Knesset e outro no Fórum Econômico Mundial em Sharm-el-Sheikh. Em ambas as ocasiões me vi levantando e batendo palmas para um presidente cujos sentimentos de amizade por Israel não podem ser postos em dúvida.

Mas nas duas vezes apenas me levantei para não ser a única pessoa no recinto a permanecer sentada.

Não que eu desvalorize sentimentos de amizade pelo meu país. Bem longe disto. Ficarei muito satisfeito se o próximo presidente americano acreditar tanto quanto o atual que o povo judeu merece o Estado-Nação que foi criado em 1948, se houver um amplo denominador comum entre a única super-potência mundial e Israel, o que é vital para garantir a segurança de Israel no mundo em nuclearização de hoje.

Mas não terei nenhum prazer se as conclusões políticas do novo presidente revelarem-se idênticas às do atual – o qual, verdade seja dita, infligiu enormes danos a Israel.

O prejuízo não foi intencional, claro. Mas foi uma função direta das políticas equivocadas de Bush.

Ansioso, ao assumir o cargo, para se dissociar do antecessor, que se havia empenhado tanto para tentar resolver o conflito israelense-palestino, Bush afastou-se completamente do processo de paz. Na verdade, sua primeira ação foi dar carta-branca ao então primeiro-ministro Ariel Sharon para manter Yasser Arafat fisicamente isolado, até a morte do líder palestino.

Os eventos do 11|09|2001 forçaram-no a repensar sua política, e em junho de 2002 fez um discurso que ficou conhecido como “a visão Bush”. Mas a visão era embaçada, e Bush fez pouco para concretizá-la. Logo, sua decisão de promover uma guerra no Iraque roubou-lhe toda a atenção. E essa guerra contribuiu diretamente para o fortalecimento do Irã, minando, portanto, a segurança de Israel no longo prazo.

Quando Bush foi à guerra no Iraque, aparentemente percebeu que não podia abandonar totalmente a questão israelense-palestina e criou o Quarteto de Madri junto com a União Européia, ONU e Rússia. Mas o único produto significativo do Quarteto, o Road Map, não chegou a funcionar e logo tornou-se uma ferramenta usada por todos opositores à paz, nos dois lados, para impedir qualquer progresso político.

Como nova estrutura política, ademais, o quarteto apenas neutralizou outros atores globais que poderiam ter sido importantes no processo, num momento em que os EUA praticamente não atuavam.

E a lista de políticas danosas vai adiante. Em 2004, Bush apoiou a decisão de Sharon de se retirar de Gaza unilateralmente, em vez de coordenar a retirada com o então recém-eleito presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas. Como se tornou claro, a ação de Sharon enfraqueceu Abbas e fortaleceu o Hamas. O movimento islamista tornou-se capaz de argumentar persuasivamente que os longos anos de negociação não haviam produzido nada, enquanto quatro anos de luta armada teriam ganho toda a Faixa de Gaza para os palestinos.

George W. Bush

George W. Bush

Quando Bush chegou à conclusão, um ano depois, que podia forçar a democratização do mundo árabe, demandou de Sharon que permitisse ao Hamas participar nas eleições para o parlamento palestino. Não importava que tal atitude fosse uma contravenção direta aos Acordos de Oslo, que proibia a participação de organizações terroristas em eleições. Também aqui, a política de Bush gerou um desastre: o Hamas venceu as eleições. E todos nós sabemos o resto.

Quando, no verão de 2006, Israel se viu emaranhado numa guerra problemática no Líbano, Bush acreditou que, como bom amigo de Israel, tinha que dar ao governo Olmert mais tempo do que realmente necessitava até pressionar por um cessar-fogo. Graças ao apoio de Bush, a campanha militar prolongou-se inutilmente e Israel pagou um alto custo estratégico.

E quando os EUA convocaram a cúpula de Annapolis no final do ano passado, Bush desperdiçou o enorme potencial inerente a um encontro regional tão amplo. O presidente permitiu a Israel não colocar na mesa nenhuma das questões centrais de seu conflito com os palestinos, frustrando assim qualquer avanço da Iniciativa Árabe de Paz, que promete relações normais entre o mundo árabe e Israel caso Jerusalém faça a paz com seus vizinhos.

Não tem havido muita mudança nas formas equivocadas do governo Bush agir. As atuais conversações de Israel com a Síria vêm se desenvolvendo contra uma postura extremamente fria dos americanos.

O próximo presidente dos EUA terá que trabalhar duro para consertar o estrago feito pelo nosso fiel amigo na Casa Branca. Seja Barack Obama ou John McCain, só terá sucesso em sua tarefa se entender que os interesses comuns de seu país e Israel estão numa paz entre Israel e seus vizinhos.

Essa paz tornaria mais fácil para os EUA retirar-se do Iraque, apresentar ao Irã uma frente regional mais coesa e unificada e enfraquecer as forças extremistas para as quais o conflito israelense-árabe tem sido menos uma razão do que uma desculpa para suas operações.

Em outras palavras, o amigo de verdade de Israel não é nenhum Bush. É um amigo da paz no Oriente Médio.


Yossi Beilin, deputado do Knesset e ex-ministro da justiça de Israel, foi um dos principais articuladores dos Acordos de Oslo e Genebra.

 

[ publicado no Forward em 19|06|08 e traduzido por Moisés Storch para o PAZ AGORA|BR ]

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