A visita do ex-presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, a Israel não foi tão agitada como se poderia esperar. O primeiro-ministro e o ministro de defesa, ambos pessoas muito ocupadas, não encontraram tempo para se reunir com ele. Bibi Netanyahu, líder da oposição – que para sua tristeza não tem estado tão ocupado e, portanto, tem tempo de sobra para se autonomear como guardião de nossa honra nacional – disse que não se reuniria a Carter devido às suas “posições anti-israelenses nos últimos anos.” Não está claro se Carter tinha desejo de se reunir com Bibi, mas o importante é que a nossa honra nacional foi de novo preservada.
Por outro lado, o presidente Shimon Peres, o ex-querido dos colonos, que respaldou a criação dos primeiros assentamentos na década de 1970, repreendeu Carter com severidade. Isto marca a contínua negação da maioria da sociedade israelense e de sua liderança em ver a imagem desagradável no espelho.
Peres espera que Carter continue no imutável jogo americano-israelense, pelo qual sempre que Israel lança uma nova onda de assentamentos, ou supera a cota mensal de baixas palestinas, o porta-voz da Casa Branca “expressa sua preocupação”, sem nunca deixar de mostrar sua imparcialidade condenando também o terrorismo palestino.
Culpados São Só Eles?
Assim, como acontece com qualquer um que vai além de “expressar sua preocupação” com os atos de Israel, Carter é imediatamente indiciado e condenado por seu “anti-israelismo”, e taxado de anti-semita.
Carter não se deixa enganar, diferentemente de todo tipo de “amigos de Israel” que chegam em suas visitas carregados de solidariedade hipócrita. Não fica bem insultar seus anfitriões israelenses, ou, Deus os livre, colocar questões difíceis com respeito à política de Israel.
Em 1976, quando foi eleito como presidente, apenas uns 3.000 colonos residiam nos territórios. Hoje em dia, o número de colonos cresceu quase 100 vezes, para perto de 300.000.
Carter já percorreu a Cisjordânia com maior freqüência que a maioria dos políticos locais. E diz que um sistema que institucionaliza a separação física, política e legal entre diferentes grupos de população que residem no mesmo território, e que viola gravemente os direitos humanos de milhões de palestinos, é uma espécie de apartheid.
Sem dúvida, diferentemente de outros políticos cuja popularidade política depende das doações e do apoio do lobby judaico-cristão dos “amigos de Israel” nos EUA, Carter não tem nenhuma necessidade de ser popular. Daí que, consistente e corajosamente levanta as difíceis questões vindas da política de Israel com respeito aos palestinos.
A Realidade Atual é Resultado das Opções de Israel
Pode-se concordar ou não com seu ativismo diplomático e as reuniões com o mais assassino dos atuais inimigos de Israel. Mas este homem, que viu nascer o empreendimento de assentamento israelense, sabe bem o que muitos israelenses (a maioria dos quais nem têm idéia de onde fica a Linha Verde) preferem esquecer: A realidade que prevalece na Cisjordânia nestes dias não existe desde a criação do mundo. É o resultado direto de decisões políticas feitas por todos os governos israelenses durante as últimas quatro décadas.
É interessante observar que a agressiva rejeição de Carter por parte da liderança política de Israel contradiz diretamente os laços oficiais entre Israel e os Estados Unidos. As freqüentes visitas de nossos primeiros-ministros aos EUA são em sua maioria destinada a levantamento de fundos, “fortalecer nossos vínculos estratégicos” e criar a impressão de que estamos engajados nestes conflitos sangrentos que já duram 100 anos.
Só que a realidade é um pouco diferente: os governos de Israel, por gerações, negaram-se a negociar a sério com os palestinos sobre o futuro dos territórios. E os assentamentos criaram uma massa de fatos consumados em que não se mexe.
As negociações que se esperaria que Israel mantivesse com os palestinos, foram na verdade feitas apenas internamente. Às vezes permitindo alguma participação dos americanos. Hilariante se não fosse trágico. E dos palestinos sempre foi requerido que ficassem calmos e bem educados.
Depois de 40 anos, iria nos fazer bem entendermos que posturas simplistas de “melhor amigo de Israel” são parte dos elementos que servem para perpetuar o conflito palestino-israelense, em lugar de resolvê-lo,
Pessoas como Jimmy Carter, que apresentam aos israelenses e aos palestinos as verdadeiras opções existentes e as verdadeiras conseqüências de seus atos, são as que contribuem para a criação de uma cultura política local que se baseia em fatos, e não na fantasia religiosa e nacionalista.
Dror Etkes foi diretor da Equipe de Monitoramento de Assentamentos do PAZ AGORA.
[ publicado no Ynet e traduzido pelo PAZ AGORA|BR ]