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Os cidadãos árabes de Israel e a guerra no Líbano
[ visão de um cidadão palestino de Israel – entrevista de Ahmed Tibi ]
bitterlemons: O que fez com que um importante analista político do jornal Maariv, Ben Caspit, o convidasse a deixar Israel, no auge da guerra no Líbano?
Tibi: Acho que a atmosfera geral do Estado israelense durante a guerra foi de medo e frustrações radicais, com a tendência de achar o ‘inimigo’ mais próximo que se pudesse pegar. Isto foi feito tomando como alvo cidadãos palestinos do Estado de Israel, especialmente sua liderança. Caspit o fez publicando este artigo ‘macartista” pressionando-me a me colocar na sua posição, apoiar a guerra e o exército, ou deixar o país, só porque eu disse logo no início: ‘Parem a guerra, sou contra ela’.
bitterlemons: Como você explica a visível simpatia dos cidadãos árabes de Israel pelo Hizbolá nesta guerra, dado que um movimento xiíta e seus foguetes mataram israelenses árabes tanto quanto judeus?
Tibi: A imensa maioria dos árabes em Israel se opôs à guerra. Os árabes perceberam Israel como o lado agressor e todo o Líbano como a vítima desta grande máquina militar destruindo infra-estrutura e matando centenas de civis – mulheres, crianças e idosos.
Foi apenas natural que tivéssemos expressado empatia pela vítima, dizendo ao mesmo tempo que somos contra alvejar civis, seja em Beirute, Haifa ou Gaza.
bitterlemons: Qual a sua visão pessoal do Hizbolá, sua ideologia e a forma como a guerra começou?
Tibi: Desde seu início, o Hizbolá dizia que tentaria seqüestrar soldados israelenses para trocá-los por prisioneiros libaneses. Era óbvio. Acho que não ter libertado Samir Kuntar [o mais famoso e antigo preso libanês em Israel] no último minuto em 2004 [a última troca de presos] foi um êrro político.
Quando se deixa uma terra que estava ocupada, encerra-se todo o caso ao também soltar os prisioneiros. O mesmo êrro está sendo feito por Israel na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. Obviamente, de um ponto de vista sócio-religioso nós divergimos do Hizbolá, mas este não é o caso aqui. Estamos falando sobre apoiar ou não a guerra no Libano, apoiar ou não a destruição do Líbano.
Quando [o líder iraniano Mahmoud] Ahmadinezhad disse há alguns meses que Israel deveria ser destruído, eu critiquei essa declaração. A solução de dois Estados é a melhor. Estamos na era de construir um país, não de destruir um país.
bitterlemons: Inicialmente, por exemplo quando o premier Olmert falou pela primeira vez em 17/7 sobre a guerra no Knesset, os deputados árabes não criticaram o esforço de guerra israelense. O que mudou o seu entendimento?
Tibi: Nada. 15 minutos antes do discurso de Olmert eu propus uma moção de desconfiança a este governo, o ataquei e me opus à guerra. Ter silenciado durante o discurso não deve ser interpretado`de forma exagerada.
bitterlemons: Como o senhor vê o efeito geral da posição dos árabes israelenses nesta guerra sobre as relações entre árabes e judeus em Israel?
Tibi: Nós dissemos categoricamente que somos contra o disparo de foguetes contra Haifa e Naharia. E nos empatizamos com as famílias de mortos e feridos. Acho que a guerra em si, que foi iniciada contra o país árabe mais liberal e civilizado da região, com a destruição que provocou e as posições da liderança política e da imprensa israelenses, alargou a distância que já existia entre a maioria judia e a minoria árabe .
O esforço de nos ditar opiniões e posições, por parte de jornalistas e líderes, foi um tipo de tentativa fascista de nos intimidar por causa da nossa oposição à guerra. Esses artigos e posições foram uma clara expressão fascista de um espírito belicoso disseminado que está varrendo o país.
Mas isto já foi visto várias vezes. Estávamos lá em 1982 quando o consenso apoiou a guerra, e depois se dividiu e quebrou. Hoje estamos na mesma posição, com o consenso de apoio à guerra já começando a ruir. O Meretz está mudando sua visão, e a ala direita está atacando o governo, acusando-o de administração deficiente da guerra.
Estávamos sozinhos no começo, mas não estamos mais. Mas ninguém irá nos dizer daqui a um ou dois meses ‘vocês estavam certos’, porque nós somos árabes e não partes do consenso. Eu não tenho muita certeza de que Ben Caspit vá escrever ‘Ahmed, me desculpe’.
bitterlemons: Como você vê a estabilidade do governo Olmert agora que existe um cessar-fogo?
Tibi: Como médico, posso dizer que há um ‘mau prognóstico’, no aspecto pessoal e político. Pessoalmente, Ehud Olmert perdeu pontos enormes como líder, o ministro da defesa Amir Peretz perdeu muito e está sendo atacando até dentro do seu partido trabalhista, e o chefe do Estado-Maior Dan Halutz deveria sentir-se feliz caso mantivesse o cargo, assim como outros generais.
Israel perdeu politicamente, militarmente e sócio-economicamente. A economia israelense foi devastada, pelo menos U$4 bilhões em perdas nos mercados. Dissemos logo no início que isto ocorreria.
bitterlemons: Como você vê o acordo de cessar-fogo?
Tibi: Primeiro, haverá uma parada na guerra aérea e ataques por mísseis, mas haverá confrontos no sul do Líbano. Estamos longe do silêncio.
Israel deve se retirar das Fazendas de Chebaa e não deixar nenhuma desculpa para que alguém possa dizer que controla terras libanesas. Não deve invadir espaço aéreo ou marítimo libanês. O Líbano e o Hizbolá devem fazer o mesmo, respeitando a soberania israelense. Uma troca de presos deve ocorrer. Eu disse isto tudo desde o início.
bitterlemons: O senhor viajou muitas vezes ao Líbano e conhece bem suas lideranças. É um candidato a ajudar na mediação de uma troca de prisioneiros?
Tibi: Não acho que esta seja uma tarefa para alguém que, como eu, seja da comunidade árabe-israelense. Os alemães e outros europeus ou a ONU são melhores para isto.
O deputado AHMED TIBI é vice-presidente do parlamento israelense e lidera o partido ‘Movimento Árabe por Mudança’ desde 1999.
© bitterlemons.org 14/08/2006 versão brasileira PAZ AGORA|BR
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