Oslo volta à vida

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Nova vida para Oslo

O plano de desligamento do primeiro-ministro Ariel Sharon se enquadra mais uma vez na agenda da discussão sobre fronteiras, que se tornou menos notável após o fracasso de Camp David e a eclosão da Intifada. O problema é que, por sua importância, a discussão pública se difunde com clichês e meias-verdades, que removem o assunto do seu próprio contexto.

O primeiro clichê, que pôde ser ouvido repetidas vezes desde que Sharon começou a defender a retirada da Faixa de Gaza e nordeste de Samária, descreve o discurso de Israel estar dando o primeiro passo em prol da retirada dos territórios e do fim da ocupação de 37 anos. Sharon é apresentado como um tipo de messias secular que sofreu um momento de epifania, e em sua fraqueza decidiu recuar e retirar Israel dos assentamentos que ele mesmo estabeleceu no passado com o mesmo entusiasmo.

Não há dúvidas de que Sharon está aceitando uma aproximação com seus rivais, que não queriam vê-lo no poder e pediam a sua renúncia até que ele se posicionou contra os colonos. Eles, como ele, também podem mudar de idéia, mas é evidente que as propostas de desmantelamento dos assentamentos são mais concretas que as precedentes.

rabin + clinton + arafatAlém disso, ele deveria ser parabenizado por sua coragem política em lançar o plano de desocupação, contrariando a opinião da maioria do seu partido. Mas com todo o respeito, o seu plano está longe de ser “o primeiro passo da saída dos territórios”. Não podemos esquecer que ele foi precedido por primeiros-ministros como Yitzhak Rabin e Shimon Peres nos Acordos de Oslo, Benjamin Netanyahu em outros acordos e Ehud Barak em Sharm Al Sheikh e propostas de Camp David, nas quais se ofereceu a divisão de Jerusalém e a concessão da soberania do Monte do Templo.

Os predecessores de Sharon estabeleceram a Autoridade Palestina, trouxeram o presidente da Organização pela Libertação da Palestina (OLP) Yasser Arafat aos territórios, desmantelaram a Administração Militar, retiraram as Forças de Defesa de Israel e delimitaram os parâmetros para um acordo final.

Nem tudo era temporário. As bases militares de treinamento, que o major-general Sharon transferiu para a Cisjordânia como um primeiro passo para estabelecer os assentamentos, foram desmanteladas e reconstruídas dentro da Linha Verde com patrocínio americano. É verdade que paralelamente à retirada parcial, a construção de assentamentos foi reforçada e estradas exclusivas para eles foram pavimentadas. Mas a intenção de deixar os territórios estava clara, mesmo quando Sharon se opunha a ela.

População de colonos de 1967 a 2000

População de colonos de 1967 a 2000

Esquecer o passado está muito evidente no segundo clichê popular nos discursos públicos: “Oslo está morto”. Há poucas razões para isto. O processo que começou com muita esperança aparenta agora ser um fracasso histórico, cujos iniciadores estão ocupados com desculpas e acusações. É difícil imaginar um acordo que tenha sido mais violado, tanto em palavra como em espírito. Arafat, que havia sido um dirigente internacionalmente reconhecido e símbolo da paz, reassumiu o status de terrorista e foi preso na Muqata. As Forças de Defesa de Israel retornaram aos territórios.

Apesar disto, foi o governo de Sharon – o maior opositor a Oslo – que insistiu na reconfirmação dos acordos moribundos com a Autoridade Palestina. A decisão do governo relativa à desocupação especificamente determina que os acordos em muitas áreas “continuarão existindo”, desde a lista de armas da AP à operação de cruzamento das fronteiras e à divisão do espectro eletromagnético.

Apesar da hostilidade e beligerância, ambos os lados têm interesse em implementar os acordos. Para os palestinos, eles são uma fonte de autoridade para o que resta de sua soberania e independência. Para Israel, os “acordos existentes” certificam a dispensa da renovação da Administração Militar, com seu pesado preço econômico e moral. Em Jerusalém e Ramala se prefere manter a ficção de Oslo como um modelo de cooperação do que cair num vácuo legal.

Portanto, o plano de desligamento de Sharon se beneficia do suporte legal dos Acordos de Oslo e lhes restitui a validade. Apesar do seu desejo de evitar os acordos, Sharon está agindo de acordo com eles – pois o que seria a retirada da Faixa de Gaza e dos assentamentos de Ganim e Kaddim no nordeste de Samaria, se não a implementação do “terceiro passo” dos Acordos de Oslo, nos quais Israel prometeu se retirar militarmente para “locais definidos”?

 [ publicado no Haaretz e traduzido pelo PAZ AGORA|BR ]

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