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Procuram-se: Moderados Fanáticos
Você sabe o que me deixa louco? É quando minha esposa me diz que não estou fazendo nada para ajudar na casa – e eu não tenho feito nada para ajudar na casa. Não há nada que mais enfurece do que alguém expor suas faltas – e estando certo.
O que é verdade em casa é verdadeiro na diplomacia. Fui lembrado disso ao assistir à enfurecida e histérica reação do partido governante de Israel, o Likud, ao tratado de paz virtual – conhecido como Acordo de Genebra – que foi trabalhado por Yossi Beilin, ex-ministro da justiça israelense, e Yassir Abed Rabbo, antigo ministro de informação palestino. Os senhores Beilin e Abed Rabbo, com apoio financeiro do governo suiço, decidiram tentar desenhar um tratado de paz detalhado, com mapas, num momento em que seus governos estavam paralisados. Após três anos, eles o fizeram. Apertaram as mãos em 12 de outubro, e hoje estão postando cópias em hebraico e árabe para cada lar em Israel, na Cisjordânia e Gaza.
Ariel Sharon e sua coalizão de extrema-direita atacaram, acusando traição e vociferando sobre o atrevimento de. Beilin desenhar um tratado de paz virtual com o representante de Yasser Arafat. As críticas desmedidas do Likud a Beilin – e ao chefe do Estado-Maior do Exército de Israel quando este apontou a relutância do governo Sharon em dar força aos moderados palestinos – tiveram todas as características de um partido governante que sabe que não lavou os pratos, não fez nenhuma iniciativa criativa pela paz desde que chegou ao poder, e odeia ficar exposto.
O Acordo de Genebra revive a iniciativa de paz primeiramente esboçada pelo presidente Clinton. Não é preciso aceitar cada palavra para enxergar sua básica sabedoria e sua imparcialidade: em troca da paz com Israel, os palestinos ganham um estado desmilitarizado na Cisjordânia e Gaza. Também ganham os bairros árabes de Jerusalém Oriental e soberania sobre o Monte do Templo, mas sob uma força internacional de segurança permanente, com total acesso dos judeus. Os israelenses ganham a manutenção de assentamentos na Cisjordânia com 300 a 400 mil judeus (em troca de uma quantidade equivalente de terras de Israel), incluindo praticamente todos novos bairros judeus construídos em Jerusalém no lado árabe da cidade. Cerca de 30.000 refugiados palestinos ganham o retorno a suas casas dentro de Israel, e todos os refugiados recebem compensação.
Pesquisas mostram que de 35 a 40% dos israelenses e palestinos já apóiam a idéia, sem que nenhum dos governos o tenha endossado.
“Nosso entendimento é virtual, porque não somos o governo e não îmaginamos sê-lo”, disse Beilin, cujo Acordo foi co-assinado por um ex-chefe do Estado-Maior do exército israelense, um ex-dirigente do Mossad (serviço secreto de Israel), e líderes da milícia Tanzim de Arafat.. “Mas precisamos criar um mundo virtual que impactará o mundo real ao demonstrar que um acordo trabalhável é possível. É inconcebível que nos últimos três anos não tenha havido encontros oficiais entre israelenses e palestinos para uma solução permanente.”
Por volta de 2010, haverá mais palestinos do que judeus vivendo em Israel, Cisjordânia e Gaza, postas em conjunto”., adicionou Beilin. “Isso pode não interessar ao presidente Bush, mas interessa a mim e deve interessar a Sharon. Se não fizermos algo para criar uma fronteira com os palestinos, estaremos pondo um fim ao sonho sionista.”
O que sempre admirei em Beilin é que ele é um moderado fanático – tão comprometido com sua moderação quanto os extremistas são com seus extremismos.
Num Oriente Médio em que os extremistas tendem a ocupar todo espaço, e os moderados tendem a se afastar, o exemplo que ele e seus parceiros palestinos estão dando é crítico. Ele mostra que a sociedade civil em Israel e na Cisjordânia ainda está viva e se recusa a se entregar ao pessimismo. Mas eles também precisam, e merecem, de estímulo e ajuda da América, agora.
Nós lhes devemos isso. Nós devemos isso a nós mesmos. Porque a mesma luta campeia na Arábia Saudita e no Iraque, onde os extremistas vem intimidando os moderados, de todas as maneiras – explodindo a Cruz Vermelha, as Nações Unidas, e correligionários muçulmanos. Podemos treinar todos policiais que desejarmos no Iraque ou ao redor do mundo árabe, mas a não ser que possamos dar força aos moderados dali – aqueles prontos para agir de acordo com as esperanças das maiorias intimidadas – um futuro decente será impossível.
Portanto, moderados de todos os países, uni-vos! Nós não temos nada a perder a não ser nosso pessimismo. Ou fazemos o futuro sepultar o passado, ou os maus sujeitos assegurarão que o passado enterre o futuro.
[ publicado em16|11|03 no The New York Times e traduzido pelo PAZ AGORA|BR ]