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Dror Etkes é a pessoa do PAZ AGORA que sabe exatamente quantos assentamentos e postos avançados existem em Judéia e Samária (nomes bíblicos do Sul e Norte da Cisjordânia ocupada, respectivamente). Numa excursão na região, ele explica por que é um verdadeiro patriota.
No auge da invasão americana do Iraque, Dror Etkes estava imerso numa excursão de rotina a postos avançados nos cumes das colinas de Samária quando seu bip exibiu uma mensagem bizarra: “Novo posto avançado chamado Neveh Hamzizim sendo instalado neste momento nos subúrbios de Bagdá: A ausência de ativistas do PAZ AGORA é sentida. Por favor, pare de atrapalhar a Amana. Assinado, Coordenador de Absorção.”
Elkes não perdeu o bom-humor: “Eu liguei para a Amana [o braço de colonização do Gush Emunim – o movimento Bloco da Fé] para tentar descobrir quem mandou a mensagem”, ele recorda. “Eu queria lhes dizer que gostei da brincadeira, mas não consegui encontrar o ‘coordenador’ “.
Essa não foi a primeira vez que as muito carregadas relações entre a pessoa que ostenta o distinto título de “chefe da Equipe de Monitoramento de Assentamentos do PAZ AGORA” e os objetos do monitoramento – os colonos judeus nos territórios – tem sido entremeadas com essas trocas de ironias.
“Um dia, quando quisermos comemorar nosso magnífico projeto de colonização, compraremos do PAZ AGORA toda a informação e relatórios que eles produziram nos últimos anos”, diz Yehoshua Mor Yosef, porta-voz do Conselho das Colônias de Yesha (Cisjordânia e Gaza). “Qualquer um que conheça Zambish [Ze’ev Hever, secretário-geral da Amana] também sabe que ele não tem nem um computador em sua sala. Ele dirige tudo de cabeça. Se você precisa de uma lista ordenada de todos os postos avançados que foram implantados nos últimos anos, você não a encontrará conosco. Quanto menos conversa e menos documentação, melhor. Para isso, você tem o PAZ AGORA.”
Os colonos não são os únicos que mostram interesse nos dados publicados pelo PAZ AGORA sobre o empreendimento de colonização dos territórios. Nos últimos anos, os relatórios do movimento se tornaram o banco de dados usados pelos tomadores de decisões em Jerusalém, e muitas vezes também em Washington. Algumas das exigências que o governo norte-americano tem feito a Israel foram baseadas em descobertas do PAZ AGORA. É um tanto estranho, à luz do fato de que os relatórios em questão são resultado do trabalho de uma pessoa que cobre a região armado de uma câmera digital, uma memória extraordinária, e um profundo interesse pelo que vê.
“A população israelense está mostrando uma incrível ignorância sobre o que está acontecendo além da Linha Verde [fronteira de 1967]”, diz Etkes. “É uma ignorância acompanhada por indiferença e impressionante falta de responsabilidade. E os colonos, os governos de Israel e o establishment de segurança estão se aproveitando dessa atitude para criar uma realidade geopolítica de fato que irá afetar todas nossas vidas pelas próximas gerações. Os colonos e eu compartilhamos o mesmo segredo. A diferença é que eles querem mantê-lo no escuro, enquanto eu que que ele se torne de conhecimento geral.”
De fato, no último ano e meio, o trabalho de Etkes tem sido expor, documentar e monitorar cada movimento de assentamento fora da Linha Verde. Alguém já o apelidou de “caçador de postos avançados”. No curso de suas viagens de caça, ele cobre centenas e às vezes milhares de quilômetros a cada mês nas estradas da Cisjordânia, não pulando nenhuma colina ou pequena estrada. Ele se tornou intimamente conhecedor de cada torre de água e cada trailer. Nesta semana, enquanto dirigia nas estradas ao sul da Cisjordânia, escrevia o nome de cada grupo de estruturas instaladas ou abandonadas, adicionando a data e circunstância do estabelecimento de cada local. “ Faço um grande esforço para obter, tão rápido quanto possível, o nome que os colonos dão a cada local que eles estabelecem”, diz ele. “Esta é a única maneira com que posso acompanhar seus discursos internos. Do ponto de vista deles, os nomes têm grande importância, porque são tirados da Bíblia e expressam a propriedade e controle do território.
Dror nos disse haver hoje 102 postos avançados de colonos nos territórios. Destes, 61 foram estabelecidos desde o dia da eleição em fevereiro de 2001, na qual Ariel Sharon se tornou primeiro-ministro; 41 são mais antigas. O mesmo Sharon se comprometeu, como parte da aceitação pelo governo do road map, a remover todos os postos avançados erigidos durante seu período no cargo. Etkes já está familiarizado com a distância entre as declarações de políticos e realidade no campo: “Não quero tentar predizer o que acontecerá”, diz ele. “Apenas sei que o que está acontecendo agora é uma grande fachada. Um monte de barulho foi feito e tudo o que eles fizeram foi mover uns poucos pedaços de sucata enferrujada de uma colina para outra. Quando eles tocarem nos postos avançados sérios e habitados ao norte de Jerusalém, saberemos que uma nova era começou.”
O choque de Oslo …
… O choque de Oslo
No início dos anos ’90, o PAZ AGORA percebeu que era necessário monitorar de perto os desenvolvimentos além da Linha Verde. Uma consulta aos arquivos de 1991 revela uma discussão do tipo da que hoje se realiza. Os ativistas do PAZ AGORA se manifestavam num local de construção a cerca de um quilômetro do assentamento de Karnei Shomron . De acordo com o PAZ AGORA, um novo assentamento com cerca de 2.000 casas estava para ser construído no local. O governo declarava em resposta que não passava de uma tempestade num copo d’água – o novo local seria apenas um novo bairro de Karnei Shomron. A posição do governo foi transmitida pelo escritório do então Ministro da Habitação, Ariel Sharon.
Os acordos de Oslo pareciam lançar uma nova era. Até então, os governos de Israel seguiam uma política declarada de estabelecer assentamentos. Em Oslo, Israel concordou em congelar o projeto de colonização. Mas, na realidade, as coisas continuaram aquecidas. Em 1996, Mussi Raz, o então secretário-geral do PAZ AGORA, e mais tarde deputado do Knesset pelo Meretz, descobriu o que foi provavelmente o primeiro posto avançado de colonização na Cisjordânia. Ele foi estabelecido por Avri Ran sobre as colinas a leste do assentamento de Itamar (um artigo sobre as atuais feitos de Ran foi publicado nesta revista em 11|04|03). Raz entendeu que este era um importante ponto de inflexão no plano: “Desde 1992, nenhum governo concordara em estabelecer assentamentos de uma forma ordenada, e nos primeiros anos, até que [Benjamim] Netanyahu chegasse ao poder, os colonos estavam sob o choque de Oslo”, diz ele. “Mas tão logo Netanyahu se tornou primeiro-ministro, aparentemente tiveram a impressão de que as autoridades fariam vistas grossas, e deslancharam uma atividade intensa. Tão logo descobri o primeiro posto avançado, entendi que isso deveria ser o maior objetivo do movimento PAZ AGORA numa época em que não tínhamos a exata capacidade de levar 400.000 pessoas para se manifestar numa praça pública.” Raz promoveu excursões nos territórios, mapeando e marcando cada posto avançado.
Em 1999, quando se tornou deputado pelo Meretz, passou a tarefa para Didi Remez, que a manteve durante o mandato de Ehud Barak como primeiro-ministro. Remez recorda com carinho os dias e noites que passou cruzando os territórios. “Não era muito mais simples então”, lembra. “Eu deixava Tel Aviv e em menos de meia hora estava na região de Nablus, mas mesmo que estivesse a uma distância tão curta, ninguém em Tel Aviv tinha a mínima idéia do que acontecia por lá. Aqui, a gente pensava que estávamos progredindo na estrada para a paz, mas ali os colonos estabeleciam um posto avançado após o outro. Nosso objetivo era colher informação exata para que os colonos e o governo não pudessem nos contraditar numa única linha”.
“No final, a grande diferença que foi criada nos anos [do processo de paz] de Oslo entre a percepção dos palestinos sobre a situação e a percepção dos israelenses, foi um fator significativo para a erupção da intifada. Após as eleições de 2001 toda a coisa se avolumou de forma pesada. Na noite das eleições, 5 novos postos avançados foram erigidos e nos 3 meses seguintes, mais 25 foram criados. Não tínhamos alternativa senão começar a publicar novos relatórios a cada bimestre.”
Trauma de formação’
Dror Etkes, o atual ocupante do cargo, é a primeira pessoa do PAZ AGORA a monitorar os colonos em tempo integral. Ele tem 34 anos, mas sua biografia já contem vários pontos altos. Cresceu em Jerusalém numa casa religiosa. Seu pai, Immanuel Etkes, é professor no Instituto de Estudos Judaicos da Universidade Hebraica de Jerusalém; sua mãe, Hanna, dirige serviços de exame para adultos na cidade. Etkes frequentou a prestigiosa Escola Himmelfarb, mas quase ao fim da 12ª série, sua cabeça mudou.
Ao mesmo tempo em que se afastava da religião, seu mundo sofria grandes mudanças em outros aspectos também. Ele descreve seu serviço militar – inicialmente no Corpo de Paraquedistas, e depois na Inteligência – como um “trauma de formação”. A maior parte de seu serviço coincidiu com a primeira intifada, na qual ele recebeu uma lição instrutiva sobre as relações entre ocupantes e ocupados.
“Um dia, houve uma operação de grande escala de aprisionamento perto de Jenin” relata. “Centenas de homens foram detidos e forçados a sentar para aguardar o interrogatório. Eles tiveram as mãos amarradas e os olhos vendados. Em certo ponto, alguns soldados da unidade de comando chegaram e começaram a queimar os dedosdos pés de palestinos com isqueiros. Quando eu vi o que estavam fazendo parti para cima de um deles, empurrei sua mão e o chutei para longe. Naquela noite eles voltaram para acertar as contas comigo. Lembro-me dos seus comentários: “ Não é ruim o suficiente você nos envergonhar, mas fazê-lo na frente de um árabe? “.
O próprio Etkes diz que os últimos anos o tornaram mais patriota do que nunca antes. “Exitem dois slogans dos colonos: `Lute pelo seu lar” e “Não lhes dê um Estado’. Estou aqui para lutar pelo nosso lar, e para salvá-lo de se tornar um Estado de apartheid.”. Quando lhe ofereceram o emprego que hoje ocupa há 18 meses, ele não hesitou. “Percebi que todo o debate teórico entre o pessoal da esquerda era irrelevante, e que a única maneira de lutar por nosso lar é ir a campo e batalhar contra a situação de apartheid que está sendo criada ali.”
O campo, como todos sabem, é perigoso. Por limitações de orçamento, o carro que dirige não é blindado, e ele também sabe que a roupa especial que usa ofece apenas uma proteção parcial. A cada poucos quilômetros, ele salta do carro para fotografar um dos muitos marcos em memória de israelenses que percorreram antes essas estradas antes de nós e que morreram baleados. Mesmo quando percorremos uma rota pontilhada de vítimas de ataques terroristas, ele diz: “Nos últimos tempos, eu tenho tido mais medo de israelenses do que de palestinos.”
Medo da morte … >
> …Medo da morte
Os novos medos de Etkes nascem de dois eventos do ano passado. O segundo deles foi a liquidação por engano de dois guardas judeus no posto avançado de Pnei Hever por um helicóptero de ataque da Força Aérea Israelense. “Esses são exatamente os tipos de lugares que eu freqüento”, diz ele. “Preciso ser muito cuidadoso para não entrar numa situação na qual me torno um suspeito a ser alvejado.”
Um outro evento ocorreu num tórrido dia do agosto passado. Etkes estava na região do assentamento ultra-radical de Yitzhar para observar os últimos acontecimentos nu mundo dos postos avançados. “Passei pelo portão [do assentamento] em direção ao posto avançado. Rodei um pouco e formei minha impressão, mas quando me voltei para ir embora, um sujeito estava bloqueando minha passagem. Em dois minutos, o cara se transformou em 15 pessoas, que fizeram uma barricada de pedras na estrada cercando meu carro. Saí do carro. Eles tiraram o filme da minha câmera. A atmosferava estava muito ameaçadora. “Após uns 20 minutos, eles me disseram: ‘Da próxima vez que você puser os pés aqui, nós o mataremos’.
Eu achava que tudo tinha terminado; mas quando eu dirigia em direção ao portão, três caras do lado da estrada jogaram pedras em mim de uma distância de 3 a 4 metros. Por sorte, não fui ferido. Continuei dirigindo e, quando cheguei ao portão, pedi ao soldado de guarda para abri-lo rápido, mas ele respondeu que não podia faze-lo por razões de segurança. Percebi que ele estava ali apenas como ferramenta deles, que os temia. Saí do carro, abri o portão tão rápido quanto pude – o soldado não tentou me impedir – e escapei.
“Quando alcancei a estrada principal, parei para me acalmar e checar o dano no carro. Havia um grande buraco no capô, penetrado por uma das pedras. Fui imediatamente à estação de polícia em Ariel, preenchi uma queixa e identifiquei um dos atacantes. Sugeri à polícia voltarmos lá naquela mesma tarde para identificá-lo, mas eles me disseram que ‘precisariam de um batalhão para tirar alguém de lá’. Até hoje nada foi feito sobre aquela queixa. A conclusão é clara. As autoridades encarregadas de impor a lei desistiram de enfrentar os colonos na região do Cruzamento Tapuah “.
Mesmo assim, ele diz, o tratamento recebido em Yitzhar de maneira nenhuma reflete a atitude frente a ele em outros lugares. “A atitude não é uniforme”, diz ele. “Seria difícil dizer que sou recebido de braços abertos, mas afora em Yitzhar não tenho encontrado qualquer violência até aqui. Em alguns lugares até me servem café.”
Café e simpatia … >
…> Caé e simpatia
Um lugar desses é Asael O posto avançado mais ao sul no Deserto de Judéia, situa-se cerca de 1.500 metros a norte da Linha Verde, mais perto de Beer Sheva que de Jerusalém. Viajamos para o sul, passando pelo famoso assentamento de Havat Maon . Há mais e mais colinas, menos e menos sinais de habitação.
De repente, Etkes faz uma curva fechada para a esquerda e sobe uma estradinha. No topo da colina há alguns trailers, um velho ônibus, e algumas estruturas pré-fabricadas. Benvindo ao ‘Leste Selvagem’. Um soldado melancólico nos examina com indifença. Etkes para perto da estrutura central, a sala de estar comum ou centro comunitário, como é chamado aqui com um sorriso. Tuvia Smotrich sai para nos saudar. Não é a primeira vez que recebe um adversário do PAZ AGORA.
Smotrich está chegando aos 30 anos. Seu caminho para o extremo sul do Deserto da Judéia foi longo. Nasceu nas Colinas de Golan. Seu pai é o chefe de uma yeshivá (escola religiosa), embora ele próprio não use uma kipá (solideú). Até não muito tempo atrás, seu cabelo era comprido e desleixado, mas recentemente o cortou. Usa um brinco.
“Me disseram que as pessoas iriam me levar mais a sério se cortasse o cabelo”, diz. Ele fundou Asael há um ano e meio e vive ali com seis amigos. Por um tempo, se manteve vendendo falafel (sanduíche típico do Oriente Médio) nos assentamentos próximos. Agora, passa suas manhãs estudando Guemará na yeshivá de Otniel (“Com certeza me sinto deslocado lá, mas eles estudam em silêncio”). Suas tardes são freqüentemente passadas com sua unidade de reserva militar, em operações na Faixa de Gaza.
“Você já começou a procurar um novo lugar para viver?” Etkes o provoca.
Smotrich: “Não posso te dizer que não estou preocupado, mas estou mais preocupado por Tel Aviv do que por Asael.”
É um tanto estranho que você receba bem alguém que gostaria de te tirar daqui, comentou com ele. Mesmo porque, os americanos, e mesmo os palestinos, usam as informações que Etkes publica.
Smotrich: “Do meu ponto de vista, desde que ele respeite as regras, é parte do jogo. Acho que ele está seriamente enganado, mas não o está fazendo por malícia. Ele sinceramente acha que isto é bom para o povo de Israel, então farei tudo que puder para lhe explicar o quanto está errado. Se eu tiver sucesso, ele se tornará um incrível ‘jovem dos cumes’. É verdade que o que ele está fazendo na prática ajuda o inimigo, mas se eu o tratar como um inimigo, também terei que tratar Sharon como um inimigo quando evacuar os postos avançados. Isto não tem fim.”
No domingo, 4 dias após visitarmos Asael, tropas militares subiram a colina. O ônibus foi removido, mas os trailers e seus moradores – que mostraram uma resistência vigorosa – ainda estão lá.
Na última sexta-feira, a atenção da mídia foi focalizada sobre os postos avançados que estavam na lista de evacuações, como Havt Gilad e Beit El Leste. Etkes está convencido de que os colonos farão exatamente o que declararam: “Irão deslanchar uma atividade intensiva de novos postos avançados, longe dos holofotes. Farão o que puderem, como enviar containers e trailers não-habitados, com investimento mínimo, para demonstrar que tem o controle do terreno”.
Ex-piloto de guerra voa pela paz
Embarcamos num avião leve e voamos sobre a Samária. Para Etkes, esta é uma rotina: um ou mesmo dois vôos como esse por mês, 800 shekel por hora dos parcos recursos do PAZ AGORA. Decolando do campo de pouso de Herzliya, cruzamos a Linha Verde em minutos.
Quando sobrevoamos a cidade de Ariel, cujas casas formam um grande arco de leste a oeste, Etkes observa: “Este é um exemplo de como a maioria dos israelenses estão alienados do que se passa aqui. Há pessoas que se auto-intitulam esquerdistas, mas dizem que não devolveremos Ariel, porque é muito perto da Linha Verde. De fato, o limite ocidental de Ariel fica a 10 km da Linha Verde, mas sua extremidade oriental dista 28 km da Linha Verde, quase no centro da Cisjordânia.”
Depois de Ariel, começa o terreno montanhoso. Desde o início da intifada, os pilotos não voam abaixo de 6.000 pés para assegurar estar fora do alcance das armas palestinas. O piloto, Eran, ajuda Etkes a procurar mudanças nas estruturas que tenham sido movidas de um lugar para outro. Essa história faz parte da ironia de Israel. Até poucos anos atrás, ele era comandante de batalhão na Brigada de Paraquedistas em Sanur, bem a leste da Linha Verde. Então ele servia no comando de segurança na Kirya, o composto da Defesa Militar em Tel Aviv, e agora, como civil, está seguindo a carreira de piloto. Ele se identifica de todo coração com a missão de Etkes. Xinga ruidosamente os colonos. Quando aterrisamos, um dos trabalhadores no campo de pouso o interpela. Como pode um ex-oficial graduado oferecer serviços de vôo para esses inimigos de Israel?
O vôo, como Etkes supunha, levou a um monte de descobertas. As colinas fervilham de atividade. Perto de Elon Moreh, um container foi colocado no cume de uma colina, a presença de um trailer antes desconhecido é notada num cume perto de Reheilim; há um container vermelho em Ofra, outro em Kokhav Hashahar. “Os mapas que acabaram de ser preparados já não valem nada”, diz Etkes. “Isso apenas prova que os colonos precisam ser levados a sério.”
Colonos e PAZ AGORA
As novas descobertas foram reportadas nos noticiários do último domingo. Yehoshua Mor Yosef, porta-voz do Conselho [de colonos] do Yesha, não fez nenhum esforço para desmentir a informação. Do seu ponto de vista, a nova atividade é meramente uma promessa que foi cumprida. Ele até se identifica com os esforços de Etkes: “Sua obsessão mostra uma grande ligação psicológica com a Terra de Israel. Na encarnação anterior, ele deve ter sido um colono”.
Ele é uma fonte confiável de informação?
Mor Yosef: “De forma geral, seus relatórios e os do PAZ AGORA são corretos.”
Em ocasiões anteriores, o Conselho do Yesha já reagiu duramente a revelações do PAZ AGORA. Vocês uma vez chegaram a dizer que o PAZ AGORA “deu rifles a [Yasser] Arafat e seus terroristas e agora estão engajados na divisão e discórdia” ?
“Sim, nós o dissemos, mas agora tomamos uma atitude mais calma. Nosso problema não é com o PAZ AGORA, mas com o governo. Nosso problema é que uma pessoa muito graduada no PAZ AGORA tem o nome de Dan Kurtzer [o embaixador norte-americano em Israel].”
Alguns dos colonos deixam as declarações mais refinadas para o porta-voz. Alguns dias atrás, o site da Arutz Sheva, a rádio pirata dos colonos, publicou um relatório sobre o mapa de postos avançados do PAZ AGORA, que o governo usava na discussão de seu futuro. O relatorio também afirmava que, com relação a pelo menos um posto-avançado, a data citada como de sua implantação estava errada. Yaron, de Haifa, que visitou o site, escreveu iradamente: “Eles devem ser postos fora da lei.” Outra visitante do site, Ruth Moab, escreveu: “Durante o Holocausto havia judeus que foram forçados a colaborar na aniquilação de seus irmãos. Hoje, o Kapo da esquerda está fazendo isso por sua livre opção e repleto de identificação com os que odeiam judeus.”
De acordo com Haggai Segal, o chefe do departamento de notícias da Arutz Sheva, a missão que Etkes tomou para si não tem esperança. Ele se refere a um artigo que publicou no diário Ma’ariv poucos anos atrás, no início da era dos postos-avançados, no qual descrevia um dos antecessores de Etkes na tarefa, o qual ele preferiu chamar pelo nome fictício “Nimrod.”
Segal diz que ainda mantém cada palavra do que escreveu então, e como é característico dele, as palavras são pungentes: “Tanto quanto é conhecido, o PAZ AGORA tem um ativista em campo que tem a particularmente sisífica tarefa de contar os novos trailers e novas construções nos assentamentos. De tempos em tempos, suas descobertas são distribuídas aos repórteres que cobrem os territórios, em conferências de imprensa que constituem a essência da atifidade do antigo e glorioso movimento… Ele vive dentro das fronteiras do Pequeno Israel e trabalha nos territórios. Cada assentamento é pesquisado diligentemente, cada rua é examinada, porque quem pode sabe onde esses colonos estão escondendo material de combate para assentamentos…”
“Ele tem uma grande pasta de arquivos, com tabelas preparadas antecipadamente, nas quais cuidadosamente lança as volumosas estatísticas de crescimento. Os guardas da maioria dos assentamentos já o conhecem e não se enervam. No assentamento de Kedumim, na Samária, ele é ate mesmo referido com inspetor de construções e é convidado para ser o 10º homem no minian [quorum mínimo para orações coletivas] em cerimônias de circuncisão. Apenas em Kfar Tapuah ele é chamado de shtinker [informante] … Não muito tempo atrás, comprou um pequeno apartamento em Hod Hasharon. Apenas após assinar o contrato, descobriu que o vendedor tinha se mudado para um apartamento maior em Ariel [maior assentamento judaico na Cisjordânia ocupada]. Pegou sua pasta, e, sorrindo, marcou mais um “X”. Ele já sabe que a batalha está perdida, mas mesmo assim continua visitando e contando…. Em seus pesadelos, está no coração de Ariel, no ano 2025, uma cidade do tamanho de Ramat Gan, e o velho Tsali Reshef [um dos fundadores do PAZ AGORA] diz a ele: Nimrod, continue contando. Nós ainda vamos pará-los.”
Etkes continua dedicando seus dias a monitorar os postos avançados de colonos, mas diz que que tal termo não corresponde a realidade: “O que deveríamos dizer é que se tratam de “novos assentamentos”. Afinal, os postos avançados de hoje serão os assentamentos futuros. Em seu discurso interno, os colonos também tratam a maioria dos postos avançados como assentamentos orgânicos, com orçamentos separados e dinâmica independente. Amona, por exemplo, se vê como separada de Ofra, e em grande medida são de fato dois assentamentos distintos
Além da divergência política, você não se sente desconfortável diante das pessoas que vivem ali, que vocês estão querendo que sejam removidas? Não o incomoda que os jovens dali nasceram atrás da Linha Verde e vêem aquela região como sua terra natal?
Etkes: “Não. É claro que não estamos falando de uma situação ideal, mas de uma na qual temos que escolher entre alternativas. O sofrimento que eles estão causando a milhões de pessoas nos dois lados da Linha Verde, que tem que sofrer as consequencias da realidade distorcida da ocupação, não é comparável ao sofrimento que será causado àqueles jovens nascidos em Ofra que terão que evacuar suas casas.”
Quando deixamos a grande aldeia palestina de Zaatara, ao sul de Jerusalém, encontramos uma longa fila de carros palestinos esperando num posto de controle. Etkes entra pela pista direita, ultrapassa a fila e rapidamente atravessa. Seu pé pisa no acelerador, mas seu intestino se revolve: “Meio ano atrás, não seria capaz de fazer isso. Algo dentro de mim me impedia de passar sem esperar na fila, enquanto eles ficavam ali por horas. Mas a realidade venceu – se quiser continuar fazendo centenas de quilômetros por dia, não posso ficar esperando em postos de controle o tempo todo. Nós apenas vimos um exemplo maravilhoso da pantomima do apartheid. É um jogo que todos jogam: o soldado me viu passando e olhou para o outro lado, apenas por que eu tenho uma placa de licença amarela. Ele nem se preocupou em checar quem eu sou. Talvez a placa seja falsa. Ele simplesmente assumiu que eu era um israelense pela forma confiante que eu estava dirigindo. Os palestinos nem sonham em fazer isso. Esperam obedientemente. A ocupação já está dentro deles.”
Ao fim do dia, num café de Tel Aviv a apenas 60 km a oeste, mas mesmo assim tão longe, Etkes fala da intransponível disparidade entre aqui e ali: “Eu vivo uma vida dupla: de manhã, apartheid, à tarde, democracia ocidental. Muito poucas pessoas estão preparadas, desejosas e capazes de digerir a realidade que existe ali, de forma que é natural que nos meus círculos sociais me relacione com pessoas com as quais eu posso compartilhar esse segredo . É um tipo de vida que “caras de fora não podem compreender” .
Isto me marginaliza? Sim, num certo grau. Isto me fecha, mas apenas num nível pessoal, não num nível nacional. Afinal, eu não o faria apenas por mim mesmo.”
[ publicado no Magazine Haaretz em 19|06|03 – sintetizado e traduzido por Moisés Storch para o PAZ AGORA|BR ]