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Também sou tibetista (pela libertação do Tibete do jugo chinês), kurdista (pela criação de um Estado Kurdo com pedaços da Turquia, Irã e Iraque), libanista (contra a ocupação militar síria no Líbano) e um convicto cubista (contra o cerco americano a Cuba). Militei como timorista (pela libertação de Timor Leste do jugo indonésio) e como bengalista, pois cobri a guerra de libertação do Bangladesh (então Paquistão Oriental) torcendo a favor.
Fui kuweitista: em 91 indignei-me contra a anexação do Kuweit pelo Iraque. Agnóstico, porém falungista, revoltado com a odiosa perseguição que o governo chinês faz aos adeptos da seita Falung Gong.
Além de sionista, sou também um palestinista – desde meados dos anos 40 defendo a criação de dois estados na antiga Palestina (então sob mandato britânico), um árabe e outro judeu, autônomos, laicos e democráticos. Em 1948, quem tentou destruir um e anexou o outro foi a Liga Árabe.
A mesma que, em Durban, África do Sul, está financiando a mais sórdida mistificação política desde os tempos do stalinismo, quando todos aqueles que levantavam-se contra o sangrento Gulag eram acusados de ”inimigos da paz”. Esta liga estranha e outras patranhas políticas estão armando um dos maiores factóides desta era da desinformação, rolo compressor para emascular todos aqueles que consideram legítimo o direito do povo judeu de estabelecer um Lar Nacional em Sion e estigmatizá-los com o selo de intolerantes.
A velhaca equação sionismo = racismo pretende apenas impedir que eu, como internacionalista, tenha medo de manifestar-me a favor da emancipação dos povos. Intimidação para que um sionista – de qualquer nacionalidade – não se assuma simultaneamente como pacifista, humanista e defensor dos direitos dos palestinos de criar o seu estado. É o mesmo ardil rastaqüera que durante o regime militar confundia liberalismo político com subversão e, durante a Guerra Fria, acusava os sociais-democratas de lacaios do imperialismo ianque.
Defender o sionismo não significa apoiar incondicionalmente o Estado de Israel. Sobretudo porque naquele país, a partir de 1977, a aliança da direita com a ortodoxia religiosa iniciou a lenta degradação de um projeto sonhado, concebido e montado para ser exemplo de democracia, secularismo e igualdade social. Quando em 1995 aquele fanático religioso atirou no primeiro-ministro Yitzhak Rabin, matou um homem, feriu D”S e, o pior, atingiu fatalmente o projeto sionista de um Estado diferente com gente melhor.
No entanto, em Israel os movimentos progressistas conseguem reunir centenas de milhares de manifestantes em favor da paz. Poder-se-ia fazer o mesmo em Riadh, Damasco, Cairo ou Teerã? O escritor israelense Amos Oz está na linha de frente em favor do diálogo e da compreensão mas Salman Rushdie, condenado a morte por causa dos seus Versos satânicos, poderia fazer o mesmo? Quantos países da Liga Árabe podem garantir algum tipo de liberdade para as minorias étnicas, religiosas, políticas e para as mulheres quaisquer que sejam os seus credos ?
O Afeganistão dominado pelo Taliban e o Irã pelos aiatolás aproximam-se de algo que pode ser designado como tolerância? Neste teatro do absurdo falado apenas através de palavras de ordem desperdiçam-se as melhores intenções, perdem-se preciosas oportunidades. E avultam os fantasmas. Sim, sou sionista.
[ Publicado no Jornal do Brasil em 08/09/2001 ]